Pesquisar
Close this search box.

Por que o goleiro Bruno não consegue voltar a jogar? Especialistas avaliam

O goleiro Bruno, desde que recebeu o benefício do regime semiaberto, em julho do ano passado, com a possibilidade de deixar a prisão para trabalhar, tenta, em vão, uma recolocação como atleta profissional. Chegou a assinar com o Poços de Caldas, que disputa a terceira divisão do Campeonato Mineiro, mas, em razão da necessidade de liberação judicial para as tarefas do dia a dia, como viagens e concentração, Bruno jogou apenas 45 minutos de um amistoso no dia 5 de outubro.

Condenado a mais de 20 anos de prisão por sequestro, assassinato e ocultação de cadáver, cumprir as exigências para progressão de regime é o menor dos problemas. A rejeição social à sua volta aos gramados é o que chama atenção. A mobilização é tão grande que aqueles clubes que esboçam interesse em contratá-lo desistem. Foi o que aconteceu, na última sexta-feira (23), com o Operário, de Mato Grosso. “Querem ele morto. Isso não é pena, não é civilizatório. O Bruno já cumpriu a pena. Deus perdoa. A sociedade não”, declarou a advogada do goleiro, Mariana Migliorini, em entrevista ao site O Tempo.

“Infelizmente não existe programa de ressocialização de presos em nenhuma atividade esportiva, incluindo o futebol, no Brasil”, informa Paulo Feuz, presidente da comissão de direito desportivo da OAB/SP. “O que há, muitas vezes, é a ajuda a ex-jogadores, contratados quando estão em situação financeira ruim, em nome dos serviços prestados, como oportunidade, para funções administrativas”, completa Bernardo Accioly, advogado especialista em direito esportivo.

A Inglaterra, desde 2018, conta com um programa de ressocialização de presos que envolve o futebol e é chamado The Twinning Project. Lá, governo, federações e clubes promovem cursos de treinamento esportivo e arbitragem dentro das cadeias com intuito de possibilitar o desenvolvimento de habilidades sociais e oferecer oportunidades de mudança. Segundo estatísticas, 67% dos presos adultos do sexo masculino são reincidentes no primeiro ano após sair da prisão. E isso foi parcialmente atribuído ao fato de 83% dessas pessoas não terem perspectiva de emprego. Até o momento, 46 clubes da Premier League e da EFL (Federação Inglesa de Futebol) concordaram em participar do projeto, que oferece ainda o acompanhamento de uma espécie de mentor no retorno à sociedade. Até o momento, não há pesquisas que comprovem o sucesso do projeto. A expectativa é que conclusões sejam divulgadas entre 2023 e 2025.

Também não há casos de ex-detentos integrados a elencos profissionais como atletas, na Inglaterra. “A ressocialização é um direito do Bruno e o clube que lhe der essa oportunidade estará dando um exemplo positivo aos direitos humanos, em especial, do preso. Nossa sociedade é muito preconceituosa. Ele está sofrendo retaliação. Ninguém quer ter seu nome associado a ele, mas isso é preconceito. Ele pode, inclusive, processar aqueles que o impedirem de trabalhar por este motivo”, alerta Paulo Feuz.

“Não vejo esse fato como injustiça, porque cometeu um crime bárbaro. A ele deve ser permitida a chance de trabalhar? Sim, mas não como atleta profissional de futebol. Talvez com uma função administrativa num clube ou qualquer outra empresa que não tenha exposição de imagem”, pondera Bernardo Accioly.

Muitos se questionam qual seria o interesse dos clubes em cogitar a contratação do goleiro. Talvez porque muitos deles não teriam condições de ter um atleta no elenco que chegou a ser cogitado para a Seleção Brasileira. E, em razão da condição de detento, isso se torna possível financeiramente. “Provavelmente eles devem oferecer um valor de contrato bem abaixo. Então, tecnicamente seria algo bem interessante para os clubes. Mas a carga negativa de imagem que Bruno traz, é enorme”.

Operário/MT, Fluminense de Feira/BA e até Poços de Caldas/MG e Boa Esporte/MG (que contratou Bruno em 2017, antes do goleiro perder o primeiro benefício do semiaberto) sabem bem disso.

“Não há impeditivo legal. Mas a questão do Bruno está além da ressocialização. Ele não pensou nas consequências, que poderia não voltar a jogar, quando cometeu o crime. É duro, mas talvez ele não possa mesmo. Talvez deva querer algo que não tenha tanta exposição na mídia. Pode tentar algo que envolva atividade física, mas não como atleta de futebol profissional. O caso dele mostra que, dependendo do tipo de crime cometido, a resistência da sociedade é enorme. Essa questão é mais social e humana do que jurídica”, finaliza Bernardo Accioly.

Nos siga nas redes sociais: @leiemcampo

Compartilhe

Você pode gostar

Assine nossa newsletter

Toda sexta você receberá no seu e-mail os destaques da semana e as novidades do mundo do direito esportivo.