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Projeto de Lei que recria o “passe” no futebol é retrógrado e inconstitucional, afirmam especialistas

De autoria do deputado Luciano Bivar (União-PE), ex-presidente do Sport Recife, o Projeto de Lei 3353/21 que visa recriar o “passe” no futebol avançou na Câmara dos Deputados nos últimos dias. O texto estava parado, mas ganhou um novo relator na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), que agora é o deputado Arthur Oliveira Maia (União/BA).

Na prática, o retorno do “passe” significaria que os clubes voltariam a ter o controle sobre a carreira do jogador, como era feito até 26 de março de 2001. A partir desta segunda-feira, 3 de abril, será aberto o prazo para a apresentações de emendas que durará por cinco sessões da CCJ, conforme noticiou o ‘O Globo’.

Para especialistas, a proposta além de ser um grande retrocesso também é inconstitucional.

“Em pleno 2023 falar em recriar o ‘passe’ soa tão irreal quanto falar em revogar a Lei Áurea. Trata-se de uma infelicidade e desconhecimento de toda a evolução do movimento desportivo. A proposição de um PL nestes termos é um desperdício de energia, trabalho e dinheiro público”, avalia Maurício Corrêa da Veiga, advogado especializado em direito desportivo.

“Com a licença da expressão, é uma teratologia querer ressuscitar um instituto completamente inconstitucional. Querer ressuscitar a figura do passe em pleno século XXI, entra em completa rota de colisão com os direitos humanos fundamentais de primeira e segunda dimensão, só para citar alguns: liberdade de trabalho (art. 5, XIII, o equilíbrio entre a valorização social da livre inciativa e do trabalho, dignidade da pessoa humana, igualdade, não discriminação em relação aos outros tipos de trabalho existentes, primado social do trabalho”, afirma Rafael Ramos, advogado especialista em direito desportivo.

“Se o projeto prosperar, além do Brasil estar em dissonância com o resto do mundo e com as orientações da FIFA, trará um texto inconstitucional, pois, atinge ao nosso ver o Direito ao Trabalho, previsto nos artigos 6º e 7º da Constituição Federal”, diz Paulo Feuz, professor e advogado especializado em direito desportivo.

Além do restabelecimento do “passe”, a proposta aprovada pelo CESPO (Comissão de Esporte da Câmara dos Deputados) prevê ainda que, a partir dos 14 anos de idade, os atletas serão considerados autônomos. A entidade desportiva formadora de jogadores terá o direito de assinar, com os maiores de 14 anos, o primeiro contrato especial de trabalho desportivo, cujo prazo não poderá ser superior a cinco anos.

O advogado Rafael Ramos também enxerga esse trecho do projeto como um grande equívoco.

“Não há nenhuma interpretação filológica nisso, aliás é outra discrepante incongruência, afinal existirá o passe e os atletas serão autônomos? Pressupõe-se autônomo aquele que tem total liberdade na sua prestação de serviço, sem ter subordinação e pessoalidade, o que jamais ocorre na prestação do atleta profissional, que no Brasil é obrigado até aos períodos de concentração! Mais um prato cheio para a cúpula do STF julgar a Lei toda inconstitucional!”, afirma.

O PL 3353/21 tramita em caráter conclusivo e ainda será analisado pelas comissões de Trabalho, de Administração e Serviço Público; e de Constituição e Justiça e de Cidadania.

O fim do “passe” e a criação da Lei Pelé

Um dos principais responsáveis por colocar um ponto final no “passe” e consequentemente acabar com a “escravidão” no futebol brasileiro foi Pelé. Ministro dos Esportes do Brasil no primeiro governo do presidente Fernando Henrique Cardoso (1995-2001), o Rei do Futebol criou a Lei nº 9.615, conhecida como Lei Pelé, que estabeleceu normas e diretrizes para a condução do esporte brasileiro. Sancionada em 26 de março de 1998, a legislação entrou em vigor três anos depois, em 2001.

Antes da Lei Pelé, o jogador pertencia a um clube, e poderia ser assim até o final de sua carreira, a não ser que aquele o vendesse a outro time, como se fosse uma mercadoria. O antigo passe foi substituído por cláusulas especiais, indenizatória e compensatória, que passaram a ser estipulada nos contratos entre clubes e atletas. A grande diferença é que essa exigência só pode ser cobrada com o contrato em vigor.

A atual redação da lei, no art. 28, estabelece a obrigatoriedade dessas cláusulas, indenizatória (art. 28, I – devida ao clube ao qual o atleta está vinculado) e compensatória (art. 28, II – devida pela entidade ao atleta). Lembrando que essas só poderão ser buscadas dentro do período de validade do Contrato Especial de Trabalho Esportivo.

Com a mudança da lei, os jogadores passaram a procurar agentes e empresários para negociar contratos com dirigentes de clubes, acabando com o autoritarismo de dirigentes.

A Lei Pelé também foi bastante importante para a proteção do adolescente. Ficou estabelecido o limite de idade para o esporte de rendimento e a impossibilidade de submissão de menores de 14 anos a testes de seleção. Garantiu a formalização de contrato de aprendizagem; pagamento obrigatório de bolsa aprendizagem, não inferior a um salário mínimo-hora (cerca de R$ 300,00 por mês) e a duração máxima de dois anos. Após esse período, torna-se contrato de trabalho de atleta profissional (art. 29 da Pelé). A celebração ou rescisão dos contratos devem ter assistência dos pais e/ou representantes legais, vedado a agentes e a terceiros.

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