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Projeto para proteger SAFs de dívidas deixadas pelos clubes pode acabar com insegurança jurídica, dizem especialistas

O presidente do Senado Federal, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), apresentou na última quarta-feira (7) um projeto de lei (PL 2.978/2023) para atualizar a lei das SAFs (Sociedades Anônimas do Futebol), que também é de sua autoria. A proposta visa proteger as SAFs das dívidas antigas deixadas pelos clubes.

Apesar das inovações trazidas pela Lei 14.193/2021, o mercado do futebol brasileiro enfrenta um cenário de insegurança jurídica, especialmente no que diz respeito à responsabilização solidária da SAF por obrigações do clube, contraídas antes de sua constituição. Existem decisões judiciais em ambos os sentidos e essa insegurança, além de gerar críticas, pode desencorajar investidores, especialmente estrangeiros.

O Lei em Campo entrou em contato com especialistas da área para saber o que eles pensam da proposta.

“As novas previsões propostas no PL 2.978/2023 perfazem melhorias no texto da Lei da SAF, de forma a retirar margem de interpretação diversa da pretensão do legislador. Trata-se de um aperfeiçoamento do texto legal vigente, e se aprovado, integrará à lei da SAF como fundamental para correta aplicação dos direitos pretendidos. Alguns dos itens propostos reforçam previsões já inseridas atualmente, de forma a sublimar tais dispositivos, e outras questões sugeridas no PL em comento, surgiram como complemento a lacunas que se verificou na prática, de forma a tornar a legislação ainda mais efetiva, otimizando os mecanismos estabelecidos na SAF e demais partes envolvidas nesta constituição”, avalia Ana Mizutori, advogada especializada em direito desportivo.

O advogado Gabriel Caputo, especialista em direito desportivo, entende que o projeto apresentado pelo presidente do Senado ajuda a trazer uma maior segurança jurídica ao futebol brasileiro.

“O PL atacou os principais pontos controvertidos que surgiram da Lei da SAF, o que certamente contribuirá para a maior segurança jurídica no futebol brasileiro, especialmente para investidores estrangeiros, gerando um ambiente de negócios mais atraente. Por outro lado, apesar de trazer importantes alterações, o PL 2.978/2023 não modifica substancialmente o mérito da Lei da SAF, o que poderia gerar ainda mais insegurança no mercado que já está se desenvolvendo há quase dois anos com as regras estabelecidas pela Lei 14.193/2021”, analisa.

“Para solucionar a insegurança jurídica quanto à responsabilidade da SAF pelas dívidas do clube, o PL 2.978/2023: acrescenta o §7 ao art. 2º da Lei 14.193/2021, que dispõe que a constituição da SAF não implica a formação de grupo econômico; aperfeiçoa da redação do art. 9º da Lei 14.193/2021, para elucidar que a SAF não responde pelas obrigações do clube que a constituiu, anteriores ou posteriores à data de sua constituição, salvo quando lhe forem expressamente transferidas; e veda a transferência de obrigações do clube que não guardem relação com o objeto social da SAF, como, por exemplo, dívidas relacionadas à esportes que não sejam o futebol”, acrescenta Caputo.

Para o advogado trabalhista Theotonio Chermont, o projeto de lei pretende blindar ainda mais os clubes e as SAFs de sofrerem execuções fundamentadas na lei trabalhista.

“Não há na lei ou mesmo na recente proposta qualquer mecanismo de fiscalização dos pagamentos, obrigatoriedade na prestação de contas – completa falta de transparência – e punições rigorosas em caso de inadimplência. Essa deveria ser uma das principais preocupações dos envolvidos. A situação é preocupante e já havíamos alertado que os investidores das SAFs já existentes são estrangeiros, sem bens no Brasil, assim como a SAF é apenas uma figura jurídica criada para gerenciar a atividade produtiva dos clubes e dificultar o recebimento de créditos alimentares. Na falta de pagamento, certamente, os credores não terão quem executar, ainda que a lei permita direcionar para a SAF e seus gestores. Quando que a justiça comum ou do trabalho conseguirá penhorar seus bens fora do Brasil? Nunca”, diz o especialista.

“Juridicamente falando, o que causa maior espanto é a lei expressamente afirmar que a relação entre clube original e SAF não caracteriza grupo econômico, tentando evitar a responsabilização solidária desta última, tal como vem decidindo muitos tribunais. É irrelevante tal colocação, pois sempre será aplicado o artigo 2º da CLT e a primazia da realidade dos fatos”, completa Chermont.

Confira os principais pontos do projeto do senador Rodrigo Pacheco

“A Sociedade Anônima do Futebol não responde pelas obrigações do clube ou da pessoa jurídica original que a constituiu, anteriores ou posteriores à data de sua constituição, exceto quanto às obrigações que lhe forem expressamente transferidas pelo clube ou pessoa jurídica original nos atos societários previstos”, diz o trecho do projeto apresentado por Rodrigo Pacheco em que o Lei em Campo teve acesso.

O texto diz que não podem ser transferidas dívidas que não tenham relação com o objeto social da SAF, ou seja, o futebol. A proposta detalha que a empresa não pode sofrer penhora por dívidas dos clubes, desde que cumpra os pagamentos das dívidas que adquiriu.

O atual texto da lei diz que a empresa não pode sofrer penhora por dívidas dos clubes, desde que cumpra os pagamentos das dívidas que adquiriu.

“É vedada qualquer forma de constrição ao patrimônio ou às receitas da Sociedade Anônima do Futebol, inclusive por penhora ou ordem de bloqueio de valores de qualquer natureza ou espécie, com relação às obrigações do clube ou da pessoa jurídica original, anteriores ou posteriores à constituição da Sociedade Anônima do Futebol”, diz a proposta.

Em diferentes casos, o Judiciário interpretou que a SAF era responsável solidária pelas dívidas do clube por ambos participarem de um mesmo grupo econômico. A nova lei veda expressamente isso e deixa claro que clube e SAF não compõem o mesmo grupo.

“A proposta também visa a dirimir dúvidas em relação à não responsabilização da Sociedade Anônima do Futebol ou pessoa jurídica original que a constituiu, pelas obrigações do clube, exceto em relação às obrigações que forem expressamente transferidas”, prevê o texto.

Os credores do clube terão liberdade para escolher por receber ações da SAF em vez de dinheiro para pagamento dessas dívidas, porém só se a SAF autorizar o mecanismo — de acordo com a lei atual, é necessária apenas a previsão no estatuto para que isso seja permitido.

A composição acionária da SAF mostrando quem são os donos do clube com pelo menos 5% das ações deverá ser tornada pública no site do time.

Por fim, o PL 2.978/2023 define que o Regime Centralizado de Execuções – RCE (arts. 14 a 24 da Lei 14.193/2021), que vinha sendo utilizado indiscriminadamente pelos clubes, destina-se exclusivamente ao clube que tiver constituído a SAF, na forma dos incisos II e IV, do art. 2º.

Aumento de repasse da SAF para o clube

Também foi criado um novo dispositivo para aumentar o repasse da SAF ao clube, enquanto esse mantiver suas dívidas.

“Enquanto o clube ou pessoa jurídica original permanecer acionista da Sociedade Anônima do Futebol e registrar em suas demonstrações financeiras obrigações anteriores à constituição da Sociedade Anônima do Futebol, esta deverá distribuir, como dividendo mínimo obrigatório, em cada exercício social, no mínimo 25% (vinte e cinco por cento) do lucro líquido ajustado”, diz outro trecho do PL.

Criação de Conselhos

O projeto ainda determina a criação do Conselho de Administração e do Conselho Fiscal, com a presença de membros independentes, “seguindo as melhores práticas de governança e de transparência empresarial” da Comissão de Valores Mobiliários (CVM).

Obrigações educacionais

Por fim, a proposta de Pacheco penaliza o clube-empresa que não cumprir as obrigações educacionais para suas categorias de base. Caso a obrigação não seja respeitada, a SAF perde direito de usufruir do regime tributário específico criado para os clubes-empresas – Regime de Tributação Específica do Futebol (TEF).

Tramitação

O Projeto de Lei 2.978/2023 foi elaborado com auxílio do mesmo grupo de advogados que auxiliou o gabinete do presidente do Senado no projeto de lei inicial, Rodrigo Monteiro de Castro e José Franscisco Manssur.

A proposta foi encaminhada para a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) do Senado, onde está aberto o prazo para apresentação de emendas.

Crédito imagem: Pedro Souza/Atlético-MG

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