O ano de 2021 se iniciou e com ele a esperança de todos os povos para que a Covid-19 seja debelada com a ajuda indispensável da ciência. Entretanto, os efeitos da pandemia ainda provocam consequências em várias esferas e também na área desportiva.
Desde março do ano passado que tem se debatido e analisado o efeito paralisante das atividades desportivas, profissionais e de formação, sendo estas últimas as mais atingidas, tendo em vista que em muitas modalidades o desporto de formação sofre de forma dramática e põe em xeque a própria carreira de vários atletas, o que será tema de futuro artigo.
Muito se discutiu, naquela altura, acerca de antecipação de férias, redução salarial e até mesmo prorrogação de contrato especial de trabalho desportivo.
Neste momento surge um impasse que pode afetar os 40 times que disputam as séries A e B do Campeonato Brasileiro.
É que muitos atletas tinham contrato de trabalho vigente até o dia 31 de dezembro de 2020, data que seria suficiente para a conclusão dos campeonatos nacionais na hipótese de uma situação normal, que não se verificou em razão da pandemia, a provocar, como se bem sabe, a paralisação das competições já no mês de março do ano passado e o consequente prolongamento destas até o mês de fevereiro de 2021.
Com efeito, a paralisação das competições não autoriza a prorrogação automática do contrato especial de trabalho desportivo.
Neste sentido é importante trazer para o leitor a previsão constante no artigo 30 da Lei Pelé que é expresso em afirmar que o contrato de trabalho do atleta profissional terá prazo determinado, com vigência nunca inferior a 3 meses e nem superior a 5 anos.
Seria possível a celebração de novo contrato de trabalho por período suficiente para a conclusão do campeonato? Ou seja, celebração de contrato pelo prazo de 2 meses?
Esta questão restou superada durante o período em que vigorou a MP 984/2020, pois nela havia a previsão, extraordinária, de serem celebrados contratos de trabalho com os atletas pelo prazo mínimo de 30 dias.
Portanto, de 18.06.2020 a 15.10.2020, período de vigência da MP 984, poderiam ter sido celebrados contratos de trabalho com período mínimo de 30 dias (ou até mesmo prorrogações futuras diante da excepcionalidade), mas mesmo assim a própria MP dizia que tal medida seria válida até 31 de dezembro, o que poderia suscitar dúvidas e interpretações judiciais.
É importante frisar que o fato de o calendário desportivo brasileiro não seguir as datas do campeonato europeu prejudica atletas e clubes brasileiros, gerando, inclusive variações de valores de transferências a depender da janela, se de verão ou inverno[1].
Em Portugal, por exemplo, a duração do contrato de trabalho do atleta profissional é definida por época desportiva, ao contrário do que ocorre no Brasil, onde a duração é de meses e anos.
No momento em que houve a paralisação das competições houve um entendimento no sentido de se orientar que os contratos de trabalho dos atletas fossem prorrogados até o final daquela temporada.
Desta forma, em Portugal, após protocolo firmado entre a Liga de clubes, a Federação Portuguesa de Futebol, o Sindicato de Jogadores e a Associação Nacional de Treinadores de Futebol, restou definido que os atletas com vínculo contratual a expirar em 30.06.2020, ficam com o seu contrato prorrogado até ao final da temporada desportiva, sendo considerado para este efeito, o dia seguinte ao último jogo da época.
Para estes atletas que tiveram o contrato encerrado em 31 de janeiro, mas que pretendem defender os respectivos clubes por mais dois meses, quais seriam as possibilidades?
Em todos as hipóteses é preciso se pensar nas consequências trabalhistas e desportivas, razão pela qual, a celebração de um contrato de trabalho desportivo pelo prazo de 2 meses poderia gerar reclamação trabalhista no futuro (com reivindicação de cumprimento integral do contrato) e até mesmo gerar dúvidas acerca da “condição de jogo” daquele atleta, a acarretar prejuízo para todo o clube e perda de pontos perante a Justiça Desportiva.
Particularmente entendo ser possível a celebração de um contrato inferior ao prazo mínimo estabelecido em lei desde que haja negociação coletiva entre clube e sindicato de atletas. Contudo, até o momento, não me parece que esta tenha sido uma condição verificada em nenhum Estado brasileiro, o que é de se lamentar, pois a negociação coletiva resolveria muitos impasses desportivos e evitaria o alto índice de judicialização destas demandas.
Uma outra hipótese seria a negociação individual entre clube e aqueles atletas que recebam salário mensal igual ou superior a duas vezes o limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social (algo em torno de R$ 12.000,00), conforme previsão contida no Parágrafo único do art. 444 da CLT, sendo que a exigência do diploma de nível superior, poderia ser transferida ao agente ou advogado do atleta.
As consequências das prorrogações contratuais que estão sendo realizadas serão sentidas após o fim da competição, prevista para o mês de fevereiro do corrente ano.
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[1] Os campeonatos europeus têm início no segundo semestre de um ano com duração até meados de junho do ano seguinte.