A situação não é nova: logo após um jogo acirrado, no calor da emoção, um técnico se expressa de forma contrária aos regulamentos da confederação que rege o campeonato e, portanto, sofre uma punição. Acontece no Brasil. Acontece na Europa. Acontece no mundo todo.
Na última semana, aconteceu duas vezes na Inglaterra: (i) Jurgen Klopp, técnico do Liverpool, foi multado em £ 45.000 depois de admitir ter feito comentários, em entrevista após o jogo, que colocavam em questionamento a integridade do árbitro da partida entre Liverpool e West Ham (que ocorreu no dia 4 de fevereiro de 2019); e (ii) Mauricio Pochettino, técnico do Tottenham Hotspur, foi indiciado pelo uso de linguagem e/ou comportamento inadequado no final da partida contra o Burnley no sábado 23 de fevereiro. Pochettino tem até as 18h de hoje para responder às alegações.
Em ambos os casos, as alegações são de violação da regra E3 da Football Association (FA). A regra E3 trata do comportamento geral dos participantes das competições regidas pela FA. A regra E3 determina que o participante deve, a todo instante, agir de acordo com os melhores interesses do jogo (ou seja, do esporte) e não deve agir de forma imprópria, ou que traga descrédito ao jogo, ou de forma a combinar conduta violenta, abusiva, ameaçadora, indecente, seja por meio de palavras de insulto, seja por seu comportamento. A violação é “agravada”, segundo a regra E3, caso tal conduta inclua referência expressa ou implícita a pelo menos um dos seguintes aspectos: origem étnica, cor, raça, nacionalidade, religião ou crença, gênero (ou a troca dele), orientação sexual ou deficiência.
É muito fácil “condenarmos” publicamente esse tipo de conduta dos técnicos. Sentados em nossos sofás e poltronas confortáveis, assistimos aos jogos, às entrevistas e às resenhas. Indiciamos, julgamos e condenamos de forma imediata tais condutas. Porém, raramente refletimos sobre a dificuldade do tema.
Será que agiríamos de forma diferente se estivéssemos à frente de uma equipe de futebol? Seria que trataríamos bem alguns membros da mídia, certos conselheiros de clubes e torcedores que abusam dos limites impostos pelo contrato de emprego (às vezes por um fio), do estresse gerado pelas circunstâncias de cada caso, bem como da potencial afronta a valores pessoais de cada técnico?
Não seriam essas punições uma potencial violação da liberdade de expressão dos técnicos? Em casos de erro flagrante por parte dos árbitros (o que não é incomum hoje em dia), devem os técnicos ficar calados ao serem entrevistados? Afinal de contas, temos ou não temos direito a nossas próprias opiniões? Então por que seria diferente a posição dos técnicos de futebol? Claro que há limite para tudo.
Lembrem-se de que na Inglaterra as entrevistas após a partida são concedidas no mano a mano, com um repórter do canal de televisão (detentor dos direitos de transmissão) e o técnico. No Brasil a pressão é outra. Salas de entrevistas lotadas. Dependendo do estádio, a torcida está saindo por um corredor do lado da sala de entrevistas. Quantas vezes não vimos/ouvimos técnicos pedindo para as portas serem fechadas para que pudessem escutar a pergunta dos repórteres?
Para nós, amantes do futebol, pode ser bem simples. Assim que esgotamos nosso interesse, trocamos de canal e “bola pra frente”!
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Foto: UOL Esporte.