Nos últimos dias, em meio a um debate sobre os dispositivos da Lei Geral do Esporte aplicáveis aos treinadores, surgiu a seguinte pergunta: mas qual a diferença entre o treinador de futebol em relação aos outros treinadores? Eu explico a origem da questão.
No capítulo da Lei Geral do Esporte denominado “Das Relações de Trabalho no Esporte”, o legislador escolheu definir os atletas, treinadores e árbitros como trabalhadores esportivos. Especificamente sobre os treinadores, o artigo 75 dispôs que “considera-se treinador esportivo profissional a pessoa que possui como principal atividade remunerada a preparação e a supervisão da atividade esportiva de um ou vários atletas profissionais”, relacionando os seus direitos e deveres nos artigos 76 e 77, bem como as “disposições comuns aos trabalhadores esportivos” no artigo 82.
A despeito de alguma ressalva sobre o caráter genérico dos direitos e deveres legalmente estabelecidos, a legislação trouxe uma definição para a função e ainda ratificou as previsões constitucionais sobre a necessidade de basear as relações de trabalho no esporte no “primado da proteção do trabalho” e na “garantia dos direitos sociais do trabalhador esportivo”.
Prosseguindo o estudo da Lei Geral do Esporte em relação ao tema dos treinadores, chega-se à seção denominada “disposições específicas ao futebol”, que, pelo artigo 98, trata de “disposições específicas aplicáveis aos treinadores profissionais de futebol”.
De acordo com o referido dispositivo, o “treinador profissional de futebol” é considerado empregado da organização esportiva que o contrata, sendo que a anotação do contrato de trabalho na sua CTPS deve obrigatoriamente indicar o prazo de vigência do vínculo empregatício estabelecido, entre 6 meses e 2 anos, além do salário, das gratificações e das bonificações. O legislador ainda reforça que ao treinador profissional de futebol se aplica a legislação do trabalho e da previdência social, ressalvadas as incompatibilidades da Lei Geral do Esporte.
Evidente que o fato de o legislador ter se ocupado de deixar expresso que o “treinador profissional de futebol” deve ter o vínculo empregatício formalizado com o empregador, não significa que os treinadores esportivos de outras modalidades não tenham esse direito, sob pena de violação aos mais elementares preceitos constitucionais. Entretanto, aquela pergunta que inaugura essas reflexões é quase que imediata: mas qual a diferença entre o treinador de futebol e o treinador de outras modalidades?
É natural que algumas modalidades possuam uma dinâmica específica em relação ao cotidiano do futebol, mas não tenho dúvida de que os treinadores de muitos outros esportes possuem exatamente o mesmo fluxo de trabalho dos treinadores de futebol: sessões de treinamentos todos os dias, normalmente em dois períodos, uma ou mais partidas oficiais semanais, concentrações e viagens, subordinação aos diretores da organização esportiva, contraprestação paga pela organização esportiva, entre outros.
Dentro do debate em que surgiu a questão, foram feitas diversas intervenções com o objetivo de encontrar as diferenças no trabalho do treinador esportivo do futebol e de outras modalidades, sob a perspectiva fática, mas, salvo raríssimas exceções, não foi possível estabelecer uma sólida distinção. E, nesse sentido, por que a legislação se ocupou de sugerir as diferenças, sob a perspectiva jurídica? Naquele debate, não houve resposta.
Até a próxima.
Crédito imagem: Getty Images
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