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Quem tem medo do processo eleitoral?

Finalmente ocorreram as tão esperadas eleições da fase mais democrática vivenciada pelo Comitê Olímpico do Brasil (COB)!

As 35 Confederações olímpicas, 12 atletas e os 2 brasileiros membros do Comitê Olímpico Internacional (COI), formando o colégio eleitoral nos exatos termos do Estatuto da entidade, se reuniram para determinar os rumos do esporte olímpico para o período 2021-2024, reelegendo Paulo Wanderley Teixeira e Marco Antônio La Porta, presidente e vice-presidente da entidade, respectivamente. Foram escolhidos ainda os novos membros dos Conselhos de Administração e de Ética.

Quanto ao processo de escolha, a boa nova é que os eleitores puderam, finalmente, escolher, dentre as opções apresentadas, a mais adequada ao momento da entidade: além da inédita competição travada entre as 3 chapas concorrentes, o pleito foi antecedido por reuniões, debates e entrevistas, o que nos leva a crer que os que escolheram o fizeram após conhecer as credenciais de cada chapa e suas propostas para gerir a entidade.

Vale destaque o fato de que apenas homens foram eleitos: somente 2 mulheres se candidataram e apenas ao cargo de membro independente do Conselho de Administração, o que, me permitam, será matéria para uma próxima coluna.

Eu, particularmente, esperava com ansiedade a realização dessas eleições. Isso porque, há (quase exatos) 3 anos, em 11 de outubro de 2017, quando foi referendada a assunção de Paulo Wanderley Teixeira ao posto de presidente da entidade, após a renúncia do então Presidente, Carlos Arthur Nuzman, auxiliei, na condição de gerente jurídica da entidade, os trabalhos de uma comissão organizada especificamente para realizar a análise do Estatuto Social da entidade e, mais do que isso, dos aspectos relevantes de governança, com autorização, portanto, para liderar as mudanças cujo maior produto seria justamente a democratização do processo eleitoral como vemos atualmente.

Além da abertura democrática, vigente desde 2017, a criação dos Conselhos de Administração e de Ética e a ampliação do número de atletas, compondo os poderes da entidade, a inclusão de novas funções e exigências, todas relacionadas às boas práticas corporativas e que encontram justificativa na busca por integridade, fazem igualmente parte do início de um processo iniciado com a modernização da estrutura de governança, como descrita no Estatuto da entidade.

Chegaram ao fim as chamadas cláusulas de barreiras para o processo de candidatura à Presidência do COB. Antes, para ser eleito, um candidato, além de ser brasileiro, deveria, nos termos do artigo 6º do antigo Estatuto do COB, satisfazer os seguintes requisitos: ter mais de 30 (trinta) anos de idade; gozar de reputação ilibada; ter se destacado como atleta, dirigente, ou colaborador na área desportiva; não ter sido excluído do COI, do COB e das Federações Internacionais; conhecer e respeitar os princípios estabelecidos pelo COI, contidos na Carta Olímpica e no Estatuto do COB; não tenha vínculo empregatício com entidade de administração ou de prática desportiva.

Contudo, as exigências que mais chamavam a atenção, eram a necessidade de que um candidato deveria ter sido membro da Assembleia por no mínimo 5 anos e ainda precisava contar com 10 assinaturas de apoios de outros membros para então se candidatar. Ou seja, apenas os dirigentes máximos de Confederações olímpicas e que já estavam na direção da entidade há muitos anos poderiam se candidatar e desde que obtivesse 10 assinaturas de outros membros.

Desde 2017, essas exigências não existem mais e qualquer brasileiro com mais de 18 anos de idade, que não tenha sofrido pena de exclusão pelo COI, pelo COB e pelas federações internacionais e que esteja em pleno gozo dos direitos civis e políticos e não sejam cônjuges ou parentes consanguíneos ou afins, até o 2º grau ou por afinidade, do então presidente ou do vice-presidente do COB, poderão ser eleitos para os cargos de presidente e vice-presidente. Outros critérios de elegibilidade e regras de vedação podem ser consultados no próprio Estatuto do COB, notadamente nos artigos 21, 22 e 23.

No que se refere ao processo eletivo, uma alteração importante foi a previsão de abertura dos pedidos de registro de candidatura para a função de presidente e Conselho de Administração apenas após os Jogos Olímpicos de Verão, o que garante uma maior lisura no processo.

Justiça seja feita: importante lembrar que um embrião importante para a mudança foi certamente gerado ainda em 2013, quando a Lei Federal 9.615/98 ganhou seu artigo 18-A e a representatividade dos atletas e a limitação do mandato dos dirigentes estatutários passaram de meros compromissos morais a exigências legais. Os dois temas serviram de ponto de partida para os trabalhos de mudança estatutária ocorridos em 2017 e, a despeito das determinações transnacionais às quais o COB se submete, não havia como deixar de lado a observância à legislação brasileira.

Naquele momento, estávamos cientes de que o desafio que se apresentava diante da Comissão era tão grandioso quanto os problemas enfrentados pelo esporte brasileiro no período após os Jogos Olímpicos: adequar as necessidades de modernização da estrutura de governança à busca por integridade exigida pelos stakeholders do movimento esportivo e ainda às recomendações do Comitê Olímpico Internacional, visto que naquele momento o COB se encontrava suspenso.

Como se não fossem tantos os desafios, a austeridade noticiada como um dos pilares da gestão que se iniciava, também influenciou sobremaneira o modo como moldamos, na forma mais reduzida possível, a nova estrutura de governança da entidade.

A mudança do Estatuto foi vista com bons olhos pela comunidade esportiva. Mais ainda pelo Comitê Olímpico Internacional, que certamente considerou o fato como um dos motivadores do fim da suspensão da entidade meses após a modernização da entidade. As decisões da Comissão em prol da nova estrutura de governança foram reportadas ao Comitê Olímpico Internacional. que respondia a todas as nossas consultas no tempo e modo necessários para que a resposta se traduzisse em recomendações à Comissão.

Todas as modificações realizadas podem ser verificadas acessando o site da entidade https://www.cob.org.br/pt/cob/transparencia/governanca-corporativa  e conhecendo a estrutura de governança em seu momento atual.

Para aqueles que ainda temem o processo eleitoral, por costume ou teimosia, fica a certeza de que a ampliação democrática é certamente um caminho sem volta. A resposta para os que resistem à democracia – mesmo fragmentada, em tempos de internet e fake news – virá em forma de mais e mais democracia, na medida em que a cada suspeita de retrocesso, o sistema reage antecipando o processo eleitoral que se tornará ainda mais sofisticado em exigências por transparência e maior participação.

A democracia pode aparentar ser um processo simples de se alcançar, apenas com eleições mais transparentes e ocorridas na periodicidade exigida, mas tal raciocínio não prospera  quando lembramos os caminhos que nos trouxeram até esta eleição e diante dos novos cenários que nos lembram a todo instante que é o futuro da comunidade esportiva que está em jogo.

Dos 42 dias em que realizamos esse trabalho de construção colaborativa, guardo a certeza de que toda a imaginação institucional empregada naquele projeto nasceu de um desejo genuíno de idealizar soluções criativas e que estivessem à altura das complexidades que envolviam a reconstrução de uma entidade como o Comitê Olímpico do Brasil.

Fica aqui o desejo de que os eleitos se valham de energia semelhante quando investidos no próximo ano para o exercício de suas funções! Que mantenham essa energia e a capacidade de gerir a entidade a partir de ações que correspondam às reais necessidades do movimento olímpico, no Brasil e no mundo.

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