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Receita aperta o cerco a atletas por uso indevido do direito de imagem

A Receita Federal tem apertado o cerco sobre atletas por conta de uma prática usual em contratos firmados entre esportistas e clubes, mas que o órgão considera um crime contra a ordem tributária, que é o direito de imagem. Para a Receita, o direito de imagem, em grande parte, tem sido usado para burlar o fisco, resultando no pagamento de menos impostos por parte dos jogadores.

“O direito de imagem está ligado ao direito da personalidade. Toda pessoa detém o controle do uso da sua imagem. Quando tratamos do direito da imagem de pessoas comuns, ele é atributo irrenunciável da personalidade, não se confundindo com o do direito da imagem, concreta ou abstrata, de um indivíduo famoso. Pois estamos falando do uso de sua imagem, sendo dois direitos distintos, exercidos por pessoas distintas e com existência jurídica distinta”, explica a advogada especialista em direito tributário Débora Ferrareze, para o Lei em Campo.

Técnicos e atletas, em muitos casos, têm duas formas de remuneração. O salário, por meio da CLT, e o direito de imagem, pago por meio de uma empresa – pessoa jurídica (PJ). Nesses dois modelos, existem formas diferentes de tributação. O Imposto de Renda que incide na CLT, no caso dos atletas e treinadores, chega aos 27,5% do total arrecadado. Já no PJ, a carga final gira em torno dos 15%.

“Os clubes firmam contratos com empresas de material esportivo e a divulgação desse material, por exemplo é realizada pelos jogadores. Se não houvesse cessão do direito de imagem dos jogadores, os clubes não poderiam fazê-lo. Para o clube, portanto, a cessão da imagem é fundamental para a obtenção de receitas como planos de sócios e diversos outros patrocínios. Não há redução significativa de tributos para os clubes porque o INSS por eles recolhido não incide sobre a folha de salários, mas sobre suas receitas. Como regra geral, portanto, não se pode dizer que o clube paga salários sob a forma de imagem. São coisas diferentes, com finalidades e regimes jurídicos distintos”, analisa o advogado tributarista Rafael Pandolfo.

Alguns argumentos utilizados pela Receita para autuar os esportistas são que  o direito de imagem é personalíssimo e não pode ser explorado através de Pessoa Jurídica. Além disso, o Fisco considera que a remuneração da imagem possui caráter salarial, pois depende do vínculo de trabalho do jogador com o clube. “O clube precisa demonstrar e quantificar a proporção da real exploração da imagem com os valores pagos ao jogador a esse título”, adverte Pandolfo.

O artifício é permitido pela Lei Pelé desde 2011. O artigo 87-A fala que “o direito ao uso da imagem do atleta pode ser por ele cedido ou explorado, mediante ajuste contratual de natureza civil e com fixação de direitos, deveres e condições inconfundíveis com o contrato especial de trabalho desportivo”. O parágrafo único deste artigo preconiza que “quando houver, por parte do atleta, a cessão de direitos ao uso de sua imagem para a entidade de prática desportiva detentora do contrato especial de trabalho desportivo, o valor correspondente ao uso da imagem não poderá ultrapassar 40% (quarenta por cento) da remuneração total paga ao atleta, composta pela soma do salário e dos valores pagos pelo direito ao uso da imagem”.

O presidente do Sindicato dos Atletas Profissionais do Estado de São Paulo, Rinaldo Martorelli, diz que a divisão entre salário e direito de imagem traz, muitas vezes, problemas para os atletas.

“Inicialmente devemos entender que a contratação da imagem do atleta não constitui nenhuma fraude e pode perfeitamente ser feita. Historicamente o que houve foi que os clubes geriram muito mal esse tipo de contratação por dois motivos: nunca trataram de esclarecer para o atleta, no ato da contratação, as diferenças de recebimento desse contrato, que é civil, daqueles outros recebimentos que existem na relação de trabalho; e não usavam a imagem do atleta naquilo que era permitido e o não uso dava indícios de fraude. O problema é que quando o clube atrasa o pagamento da parte do contrato de imagem não tem a proteção natural da legislação trabalhista. A responsabilidade do atleta é a de querer se submeter a essa condição ou não, ele tem que ter a disposição, caso não queira esse tipo de contratação, de procurar outro clube empregador. Nosso grande desafio é fazer com que eles venham buscar esclarecimentos e informações antes de assinarem seus contratos”, argumenta Martorelli.

Para evitar problemas, é necessário que os atletas busquem uma estrutura jurídica adequada, já que um auto de infração sobre a imagem recebida nos últimos cinco anos, por exemplo, pode gerar uma multa de até 150%, colocando em risco o patrimônio que os atletas acumularam.

Para identificar as fraudes, a Receita busca saber se a imagem do jogador que recebe 40% via direito de imagem é mesmo explorada comercialmente pelo clube. Além disso, o Fisco vai atrás da empresa criada pelos jogadores para saber se ela realmente está ativa ou se é somente uma empresa fantasma. Também é levado em conta se a empresa exerce atividade econômica, se tem funcionários e se a razão da empresa existir não for simplesmente economizar tributos.

“Vale lembrar que quando o jogador é atuado, o clube também pode ser por contribuições para terceiros, FGTS, multa por não retenção do Imposto de Renda”, diz Pandolfo.

Para contestar um processo de autuação na Receita Federal o atleta tem que apresentar uma impugnação que é analisada pelas Delegacias da Receita Federal. Dessa decisão cabe recurso ao Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF) em Brasília.

“O contribuinte pode se defender pelas alegações de que a Constituição Federal e a Lei Pelé preveem expressamente a possibilidade dos jogadores cederem a exploração do seu direito de imagem para que estes se dediquem nas atividades esportivas. Antes disso, os atletas podem adotar medidas para provarem que não há evasão fiscal, como mostrar a exploração da imagem do atleta tanto pela empresa como também pelo clube. Além disso, muitos atletas criam uma empresa, figurando como sócio, e cedem sua imagem para ela. Assim, é recomendável que o jogador não seja administrador da empresa, a fim de comprovar que não há confusão patrimonial e nem planejamento tributário ilícito, nesses casos há inclusive precedente favorável no contencioso administrativo”, finaliza o advogado tributarista Tiago Conde Teixeira.

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