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Renegociação de salários do Cruzeiro pode gerar prejuízos na Justiça

Passando pela sua maior crise financeira, institucional e esportiva de seus 99 anos de história, o Cruzeiro tem buscado enxugar os gastos do clube para a temporada 2020. Uma das saídas encontradas pelos dirigentes celestes foi a renegociação dos salários dos atletas que quiserem continuar no Cruzeiro neste ano. Tudo isso para reduzir a dívida cruzeirense, que já passa dos R$ 800 milhões.

O clube estabeleceu um teto de R$ 150 mil por mês para os jogadores. A ideia é reduzir a folha salarial, estimada em R$ 15 milhões ao mês durante o ano passado, para R$ 4 milhões mensais para este ano. Os atletas que recebem acima do teto estipulado estão sendo chamados para renegociar e a proposta é a de receber os R$ 150 mil, e o valor que ultrapassar o teto entra como uma espécie de crédito, que será parcelado em até 20 vezes e começará a ser pago em 2021. Se um jogador recebe hoje R$ 350 mil por mês, ficaria recebendo R$ 150 mil por todo ano de 2020. O saldo de R$ 2,4 milhões começaria a ser pago apenas em 2021, e parcelado.

“É a única condição para honrarmos os compromissos assumidos. Não vamos incorrer nos erros que deixaram os atletas a ficar com quatro meses de salários atrasados. Não tem segurança jurídica. Estamos conversando com os atletas. É feito um documento falando que eles abrem mão de recorrer. Não sei se tem efeito jurídico. Nada garante que eles não vão à justiça. Mas todos já têm 4 meses de salário atrasado, já têm direito de ir”, explicou ao Lei em Campo o diretor de futebol do Cruzeiro, Ocimar Bolicenho.

Segundo o Cruzeiro, 98 funcionários (entre CLT e PJ) já foram demitidos pelo clube, em processo que ainda está em andamento. O Cruzeiro espera gerar uma economia de 25 milhões/ano. Mas a renegociação do salário dos atletas pode gerar problemas judiciais futuros.

“Tecnicamente não existe a possibilidade de parcelamento do salário. Não é redução. Mas não há previsão de fazê-lo. Os entendimentos sobre flexibilização de salários variam, mas em regra só podem ocorrer por norma coletiva e com redução da jornada. O que não cabe para o atleta”, analisa o juiz do trabalho Ricardo Miguel.

“A negociação coletiva obrigatoriamente precisa ser feita via sindicato dos atletas. Nós não temos no Brasil hoje nenhum caso de acordo coletivo, nem de convenção coletiva, envolvendo clubes e sindicatos de atletas. Então é uma situação não só difícil como praticamente impossível. Porque não há nenhum histórico de negociação nessa categoria, por incrível que pareça”, justifica o advogado trabalhista Carlos Ambiel.

A CLT estabelece que haja “a livre estipulação a que se refere o caput deste artigo aplica-se às hipóteses previstas no art. 611-A desta Consolidação, com a mesma eficácia legal e preponderância sobre os instrumentos coletivos, no caso de empregado portador de diploma de nível superior e que perceba salário mensal igual ou superior a duas vezes o limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social”, diz o texto. Mas um detalhe no texto pode frear a defesa do Cruzeiro no uso deste artigo.

“A criação da Reforma Trabalhista de 2017 estabeleceu o conceito de hipersuficiente. O problema é que boa parte dos atletas, se não a maioria ou a totalidade, de alguns clubes, embora ganhe mais de R$ 11.600 mil, não tem curso superior. Então não poderia ser utilizado o artigo 444. Olhando isso, somado ao artigo 468, que não pode ter alteração prejudicial juridicamente, essa alteração é completamente arriscada. Se for cumprido que foi combinado no final, não houver prejuízo, é possível que o jogador não reclame. E no caso de uma eventual discussão na justiça, o tribunal entenda que houve prejuízo. O risco [dos atletas irem à Justiça] é grande”, adverte Ambiel. Assim, os jogadores podem ajuizar ações pedindo a liberação na justiça por atraso salarial durante o ano de 2020, ou depois que o vínculo chegar ao fim.

Outro problema gerado pela estratégia cruzeirense é o recolhimento dos impostos devidos aos atletas.

“Recolhimento de FGTS, por exemplo, é mês a mês e incide sobre a remuneração, que é salário mais parcelas recebidas pelo atleta como gratificação etc. Então, o recolhimento é sempre sobre o que está no contrato e se recebe”, afirma Ricardo Miguel. Assim, voltando ao exemplo do jogador que recebe R$ 350 mil, o Cruzeiro tem que recolher os impostos sobre este valor, e não sobre os R$ 150 mil. Se não o fizer e recolher apenas o referente ao teto imposto para a temporada 2020, fica exposto a ações na justiça pedindo liberação por não depósito do FGTS.

A ideia do clube é ter, durante a disputa do Campeonato Mineiro, 28 atletas no elenco. Para a disputa da inédita Série B, Ocimar Bolicenho planeja subir o nível do elenco chegando a 32 atletas.

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