Os desdobramentos da decisão do Salgueiro de voltar atrás e decidir disputar a Copa do Nordeste 2021 não param de acontecer. Logo após a realização do sorteio dos grupos da competição na manhã desta quinta-feira (4), o presidente do clube, José Guilherme, concedeu uma entrevista coletiva para contar sobre o que levou à mudança de ideia nas últimas horas.
José Guilherme detalhou os pontos fundamentais e os bastidores do desenrolar da história, revelando que o Náutico esteve presente na negociação para que o Salgueiro desistisse de participar da Copa do Nordeste e da Copa do Brasil. A participação do Timbu no caso chamou a atenção de torcedores.
“Essa é uma questão controversa. O artigo 243 do CBJD traz a possibilidade de punição a quem atua deliberadamente de modo prejudicial à equipe que defende. É, no entanto, um artigo que tem como objetivo prevenir a manipulação de resultado por parte de atletas, o que pode ser entendido pela referência à ‘equipe que defende’. Aplicar para dirigentes seria interpretar norma penal de forma extensiva, o que não deveria ocorrer. O mesmo podemos dizer sobre eventual tentativa de aplicação do artigo 242. É uma situação completamente antiética, mas que, em razão de sua peculiaridade, seria apenas punível com base no artigo 258, que prevê uma pena bastante baixa quando analisada a natureza da infração”, avaliou Vinicius Loureiro, advogado especialista em direito desportivo.
“A princípio, não vislumbro subsunção da mencionada conduta a qualquer dos tipos previstos no CBJD; a mim, parece que este fato merece ser analisado sob perspectiva da Ética, devendo se avaliar com mais apreço as condutas dos clubes. A Federação ficará sempre mais distante disso, salvo que se demonstre a sua atuação em prol da substituição. Este episódio revela que precisamos ampliar ainda mais as proteções jurídicas em relação às competições”, completa Milton Jordão, advogado especialista em direito desportivo e colunista do Lei em Campo.
Já para o advogado especializado em direito desportivo e colunista do Lei em Campo, Gustavo Lopes, o envolvimento do clube pernambucano pode ser considerado uma infração ao Estatuto do Torcedor.
“A ‘compra’ de vaga em competição está incursa nos crimes dos arts. 41-C e 41-E do Estatuto do Torcedor por haver, em tese, aceitação de vantagem para alterar resultado de competição e por haver, em tese, fraude a resultado de competição. Isso porque o índice técnico para a competição não foi respeitado. O resultado da competição leva à vaga… se o clube desiste da vaga por dinheiro, tem-se um efeito prático nos efeitos do resultado desportivo…”.
Veja o que dizem os artigos citados
Art. 258. Assumir qualquer conduta contrária à disciplina ou à ética desportiva não tipificada pelas demais regras deste Código: Pena – suspensão de uma a seis partidas, provas ou equivalentes, se praticada por atleta, mesmo se suplente, treinador, médico ou membro da comissão técnica, e suspensão pelo prazo de quinze a cento e oitenta dias, se praticada por qualquer outra pessoa natural
Art. 41-C. Solicitar ou aceitar, para si ou para outrem, vantagem ou promessa de vantagem patrimonial ou não patrimonial para qualquer ato ou omissão destinado a alterar ou falsear o resultado de competição esportiva: Pena – reclusão de dois a seis anos e multa.
Art. 41-E. Fraudar, por qualquer meio, ou contribuir para que se fraude, de qualquer forma, o resultado de competição esportiva: Pena – reclusão de dois a seis anos e multa.
A história começou quando na última terça-feira (2) o Salgueiro protocolou um pedido na Federação Pernambucana de Futebol (FPF-PE) para sair da Copa do Nordeste e Copa do Brasil de 2021, competições que garantiu vaga por ter sido o campeão pernambucano de 2020, alegando problemas financeiros causados pela pandemia de Covid-19 e pela perda de patrocinadores e do apoio da prefeitura municipal da cidade do sertão de Pernambuco.
No entanto, tudo mudou na manhã de quinta-feira (4). O clube voltou atrás e decidiu que disputaria as duas competições. O presidente José Guilherme concedeu uma entrevista coletiva para explicar a decisão:
“O que aconteceu? Mandei a carta para a Federação (Pernambucana) dizendo que não ia participar. Quem ia ter direito era o Náutico. Quando chegou na Federação, a CBF não aceitou. Quando estava conversando com os atletas, comissão técnica e os funcionários, o telefone tocou e era o pessoal da CBF e Liga do Nordeste dizendo que a vaga estava retornando para o Salgueiro. O Náutico não teria direito a vaga. Se o Salgueiro não fosse participar, a vaga não iria para um clube de Pernambuco”.
O clube adiantou cotas para poder pagar salários de 2020. Adiantou R$ 250 mil da Copa do Brasil e R$ 550 mil da Copa do Nordeste. Houve então uma negociação com o Náutico para que o Timbu ficasse com as vagas, mas o adiantamento das cotas ficaria com o Salgueiro. O Náutico receberia apenas o valor restante e as cotas com eventuais classificações.
“Todos sabem, saiu a prefeitura, saiu os patrocínios, as contas iam bater na minha porta, querendo saber do dinheiro. Aí é fácil dizer ‘bota o time’. Não ia chegar ninguém pra me defender. No ato de desespero, tomei a decisão de procurar a FPF e o Clube Náutico Capibaribe, para que se eu saísse, ou mesmo sem negociar com o Náutico e a FPF, eu não ia participar. Procurei o Náutico, fiz a negociação, entrou o dinheiro, está na conta do clube, que é para pagar funcionários do clube”, revelou José Guilherme.
Questionado novamente sobre a origem do dinheiro, José Guilherme reforçou: “Não paguei, está na conta. Esse dinheiro envolveu Náutico e Copa do Nordeste. A Liga do Nordeste ajudou para não prejudicar o campeonato. Eu precisava do dinheiro para pagar todo mundo e tirar os cobradores da minha porta”.
Em nota oficial, o Náutico negou envolvimento em desistência do Salgueiro das Copas do Nordeste e do Brasil.
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