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STJD: Rafael Ramos, do Corinthians, é absolvido em denúncia de injúria racial contra Edenílson, do Internacional

Em julgamento nesta terça-feira (12), a 2ª Comissão Disciplinar do Superior Tribunal de Justiça Desportiva (STJD) absolveu o lateral-direito Rafael Ramos, do Corinthians, na denúncia de injúria racial contra o meia Edenílson, do Internacional, durante partida entre os dois clubes no Campeonato Brasileiro. A decisão, em primeira instância, cabe recurso e pode parar no Pleno do Tribunal.

Por maioria dos votos, os auditores consideram inconclusivos os cinco exames de ‘leitura labial’ que foram anexados ao processo.

Rafael Ramos foi denunciado pela Procuradoria do STJD no artigo 243-G do Código Brasileiro de Justiça Desportiva (CBJD), que prevê punição a quem cometer algum ato discriminatório. A pena prevista é a suspensão de cinco a dez jogos, além de uma multa de até R$ 100 mil.

Art. 243-G. Praticar ato discriminatório, desdenhoso ou ultrajante, relacionado a preconceito em razão de origem étnica, raça, sexo, cor, idade, condição de pessoa idosa ou portadora de deficiência:

PENA: suspensão de cinco a dez partidas, se praticada por atleta, mesmo se suplente, treinador, médico ou membro da comissão técnica, e suspensão pelo prazo de cento e vinte a trezentos e sessenta dias, se praticada por qualquer outra pessoa natural submetida a este Código, além de multa, de R$ 100,00 (cem reais) a R$ 100.000,00 (cem mil reais).

Como foi o julgamento

Em sessão híbrida, a Procuradoria juntou prova documental e de vídeo, enquanto a defesa de Rafael Ramos juntou prova documental, de vídeo e testemunhal.

O advogado ouviu o atleta Rafael Ramos.

“Houve aquela disputa dentro de campo. Um lance normal, disputa entre os dois jogadores, com insultos entre as duas partes, o jogo continuou até que o Edenilson se dirigiu ao árbitro dizendo que tinha sofrido um insulto racista. Foi um lance muito rápido e não sei o que ele pode ter entendido… Após o jogo me dirigi ao vestiário do Internacional e falei com ele que deve ter entendido errado, que eu nunca o chamei de macaco e que não faz parte do meu vocabulário usar essa palavra como ofensa”, disse o atleta.

A defesa ouviu ainda Alessandro Nunes, o gerente de futebol; António Ascensão, integrante da comissão técnica, e o atleta Robson Bambu, além dos peritos Anderson Santana e Fernando Pinho Barreira, que falaram tecnicamente sobre a análise pericial feita através de leitura labial e forense.

Representante da Procuradoria, Rafael Mocarzel sustentou a denúncia.

“Estamos em um caso muito triste e talvez um dos piores tipos de julgamentos no STJD. Seja por ambos os lados, a injúria racial cometida e submeter alguém que não cometeu é também doloroso. No presente caso foi instaurado inquérito, inúmeras diligências, laudos, vídeos e a conclusão foi para denúncia. As partes tiveram a oportunidade de escutar os técnicos, o denunciado e o que prevalece para a Procuradoria é o laudo pericial e imparcial do STJD. Não há nada incapaz de descaracterizar a conclusão do laudo pericial.

Ha divergências na defesa do Corinthians em fonemas e, apesar de se assemelhar, não possui elementos robustos para afastar o que o Edenilson falou e que foi concluído pelo perito. A tese de defesa do Corinthians não convenceu a Procuradoria. O termo macaco é conhecido mundialmente, Portugual e Brasil estão muito próximos e a tese de que não se usa a palavra macaco em Portugual não convence. Pela procedência da denúncia”, pediu o Procurador.

Advogado do Internacional, Rogério Pastl seguiu a mesma tese da Procuradoria.

“Não tenho como não me filiar as razões da Procuradoria. Muito me toca estar num julgamento como esse. O Internacional sofre muito no Sul com essa questão de racismo. Não conheço o Rafael Ramos e de maneira alguma o Internacional e o Edenilson têm algo contra o atleta.

Há divergência entre o que o atleta falou, entre os depoentes e os peritos falaram. Acho que o papel da Justiça Desportiva aqui não tem o poder de taxar alguém como racista ou não. Aqui estamos tratando de infrações disciplinares e esse é, infelizmente, o caso dos autos. A gente traz aqui depoimentos que nada preenchem ou desfazem o teor do laudo. Não posso deixar de frizar que a palavra macaco é utilizada de forma ofensiva contra pessoas de raça negra em todo o mundo.

Com o máximo respeito ao atleta Rafael Ramos, não há outra alternativa a não acolher a denúncia. Quando a gente tem dúvidas é necessário analisar a reação dos demais colegas no campo de jogo. Na partida os colegas do Corinthians ficaram ao lado do Edenilson e o goleiro Cássio se dirigiu ao Rafael dizendo: Rafa assim não dá”, concluiu.

Contratado por Rafael Ramos, o advogado Daniel defendeu que não há provas e pediu a absolvição do jogador.

“Não é preciso dizer o quão grave é a uma acusação desse tipo, mas também é de se colocar na balança o quão grave é a condenação de quem é inocente. Existem laudos particulares feitos a pedido do Corinthians e do Internacional. Existe ainda um laudo feito por uma junta de peritos do instituto de criminalista que não receberam para isso e essa junta chega a uma conclusão que não se pode afirmar ou dizer que Rafael teria dito a palavra macaco. Este laudo está nos autos. A grande diferença é a especialidade dos peritos. O perito labial afirma de forma técnica que não foi dita a palavra macaco”, disse o defensor, que seguiu.

“Rafael em todas as oportunidades foi taxativo ao dizer que não falou a palavra macaco e que em Portugal não se usa a palavra com o intuito de ofender … Se não existe prova absoluta, induvidosa, indiscutível, não se pode impor qualquer tipo de reprimenda a quem quer que seja. Rafael nunca teve passagem indisciplinar. Não houve ofensa racial ou qualquer tipo de cunho discriminatório. A defesa pede que seja julgada improcedente a acusação contra o atleta Rafael”, concluiu.

Como votaram os auditores

Relator do processo, o auditor Carlos Eduardo Cardoso explicou seu entendimento e voto.

O que mais me chamou a atenção foram quatro trabalhos e quatro conclusões. Ainda temos o relatório do inquérito policial do Rio Grande do Sul afirma que o vídeo foi encaminhado para análise de leitura labial e o laudo restou inconclusivo. Foram cinco trabalhos ao final…

Diante de tantas dúvidas, a Procuradoria conseguiu provar além da dúvida razoável para que eu possa julgar e condenar o denunciado? Não, a acusação não conseguiu provar além da dúvida razoável. As dúvidas brotam de todos esses trabalhos e ao mesmo tempo que levo o peso do trabalho do perito do STJD, não afasto o trabalho realizado pelos demais profissionais experts na matéria da leitura labial. Chegar a conclusão que, por mais que o atleta Edilson possa ter ouvido, acho que há a possibilidade dele ter ouvido algo parecido e reagiu conforme o que entendeu que ouviu. Ou se ele de fato ouviu aquilo mesmo, se isso saiu da boca do atleta Rafael Ramos não tenho elementos minimamente suficientes para condená-lo”, disse o relator, que direcionou palavras para Edenilson.

“Edenilson, não se sinta vencido ou derrotado pelo meu voto no sentido da absolvição. A sua luta, a sua bandeira é a mesma que a minha. Lembro da bonita história do Internacional calcada nessa luta incessante contra essa chaga que se mantém aberta lamentavelmente no século 21. Neste caso aqui, não tenho como pensar de forma diferente diante de tantos elementos que geraram dúvida. Meu voto é no sentido de rejeitar a denúncia para absolver o atleta Rafael Ramos”, finalizou o relator.

Com algumas considerações e concordando com a fundamentação do relator, os auditores Diogo Maia, Washington Rodrigues, Iuri Engel e o presidente Felipe Silva votaram pela absolvição de Rafael Ramos face a ausência de elementos que comprovem a injúria racial.

Entenda o caso

Tudo aconteceu no segundo tempo da partida. Edenilson relatou ao árbitro Bráulio da Silva Machado que foi chamado de macaco por Rafael Ramos, que negou e disse que falou “fod*-se c*****” durante uma disputa de bola.

O juiz relatou o caso na súmula, mas ressaltou que nenhum dos membros da equipe de arbitragem conseguiram atestar o que aconteceu.

“Aos 31 minutos do 2º tempo, no momento em que a partida estava paralisada, fui informado pelo jogador nº 8, da equipe SC Internacional, sr. Edenilson Andrade dos Santos, que seu adversário nº 21, sr. Rafael Antônio Figueiredo Ramos, havia proferido as seguintes palavras para ele: ‘foda-se macaco’. Neste momento paraliso a partida e chamo os jogadores envolvidos para relatarem o que havia acontecido, sendo que o jogador Edenilson Andrade dos Santos, confirma as palavras anteriormente citadas e o jogador Rafael Antônio Figueiredo Ramos, afirma que houve um mal-entendido devido ao seu sotaque (português) e diz ter proferido as seguintes palavras ‘foda-se caralho’. Devido a distância dos atletas e barulho da torcida nem eu, nem outro integrante da equipe de arbitragem consegue ouvir ou perceber qualquer das palavras acima citadas. Então dou continuidade a partida”, relatou Bráulio.

Após o apito final, Edenilson prestou depoimento e registrou um Boletim de Ocorrência na Polícia Civil. Rafael Ramos foi preso em flagrante pelo crime de injúria racial contra o volante e foi liberado mediante ao pagamento de fiança de R$ 10 mil.

A decisão não é definitiva e cabe recurso, podendo parar no Pleno do STJD – última instância da Justiça Desportiva nacional.

Crédito imagem: Estadão Conteúdo

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