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Um ano da coluna A Lei é clara [?]

Na semana que passou, no dia 5 de novembro, comemoramos um ano do início desta coluna no portal Lei em Campo. Foram mais de cinquenta edições, sendo que a primeira já dizia ao que me propunha: aclarar, jogar luzes sobre os fundamentos, a história e o desenvolvimento do Direito Esportivo.

Meu objetivo era simples, mas desafiador:

O leitor precisa de respeito. Vamos falar de forma simples, porém indo mais fundo nos problemas que nos cercam. Assim, no decorrer do tempo o portal terá uma coletânea de artigos que podem ser utilizados por estudantes de direito, pesquisadores e todo o pessoal do esporte para abrir um pouco mais os complicados caminhos da linguagem jurídico-esportiva, resguardando certo rigor acadêmico.

E assim tem sido. Nestas 52 semanas em que minha coluna foi publicada construiu-se uma coleção de textos que vem servindo para fomentar o debate e, principalmente, ajudar os alunos dos poucos cursos de Direito Esportivo no país a ter um material de referência aos seus estudos de forma aberta e gratuita.

No início foram dez edições tratando dos fundamentos do Direito Esportivo, seus princípios, características sistêmicas e autonomia, forma de organização, desterritorialização, dentre outros assuntos. Mostrei ainda no primeiro mês de publicações que o acesso às práticas esportivas era um dos direitos fundamentais do ser humano, como se lê na coluna publicada em 19 de novembro de 2018:

Portanto, em razão de se considerar tanto no Direito Internacional (Carta da Educação Física da Unesco) como na própria Constituição Federal brasileira que o acesso às práticas esportivas constitui um direito fundamental, o Direito Esportivo também se fundamenta na principiologia própria da proteção universal aos Direitos Humanos.

Depois, mais oito números falando apenas sobre o Direito Internacional e o Esporte. Tentei mostrar que o esporte é um dos sistemas onde melhor se realiza a ideia do jusinternacionalismo, ou seja, de uma comunidade global baseada no respeito ao direito. Foi o que escrevi, p.ex., na edição de 4 de fevereiro de 2019, alertando para o risco de que o combate à harmonia no campo internacional poderia acarretar graves prejuízos à organização esportiva:

Hoje a situação é bem mais grave. Governos eleitos recentemente na Europa e nas Américas não se furtam em se afastar da frágil concertação que foi possível para tentar pôr fim aos anos de guerras que assolaram toda a Terra. Em sua verve “antiglobalista”, atacam conquistas históricas, como os pactos em torno da preservação do meio ambiente e de acolhimento humanitário de pessoas que migram em busca de melhores condições de vida.

Para o esporte, para a Lex Sportiva, qualquer indício de sobreposição de políticas que ataquem o cosmopolitismo, a cooperação internacional e a autonomia de grupos e indivíduos trará consequências bastante graves.

Já a partir da edição de número 20, passei a me debruçar sobre a história do Direito Esportivo no Brasil. A proposta de “jogar luzes” sobre nossa disciplina aqui foi tornada ainda mais necessária. Comecei por contar a trajetória do pai fundador do Direito Esportivo Brasileiro João Lyra Filho, demonstrando sua importância para o desenvolvimento da área, sua erudição e combatividade, porém sem deixar de mostrar seus erros e problemas teóricos. Foi o que escrevi sobre ele na coluna de 6 de maio deste ano:

Um poço de contradições? Um homem barroco? Haveria certo oportunismo? Não. Eu não o vejo assim. É necessário analisar o homem na sua época. Ao que o mundo assistia nos anos 1930, 1940? Uma grande reação ao liberalismo econômico vinda sobretudo do movimento dos trabalhadores e fortalecida pela Revolução Russa de 1917, como, ainda, uma reação nefasta aos valores liberais por parte do nazifascismo. Regimes autoritários se alastravam, e o Brasil flertava despudoramente com eles. Getúlio Vargas chegou a receber uma condecoração de Hitler (quando estiver no Rio, vá até o Palácio do Catete e poderá vê-la exposta: um colar ornamentado por suásticas).

Esta foi a tônica da minha tentativa de desvelar a “cripto-história” do Direito Esportivo: descer aos porões, remexer os arquivos, os velhos baús cheios de poeira. Em razão desta pesquisa, acabei por mostrar um lado triste dos primórdios da nossa disciplina, atrelada em grande parte ao autoritarismo, ao eugenismo e ao racismo, assim como ao preconceito de classe. Não me furtei nem mesmo a transcrever trechos terríveis escritos por próceres do Direito Esportivo que são abertamente indefensáveis do ponto de vista da dignidade da pessoa humana e de sua incompatibilidade com o regime democrático.

Ainda que eu não seja jornalista, tive meus “furos” que reservei ao Lei em Campo. Fruto de minhas pesquisas acadêmicas, acabei por descobrir o texto hoje praticamente desconhecido o primeiro código de justiça esportiva do país, aquele da Resolução do CND de 4 de novembro de 1942, que instituiu os Tribunais de Penas nas federações estaduais de futebol.

Trata-se de um documento de valor histórico tremendo e que se mostra como fundamental para o estudo do Direito Esportivo brasileiro. A norma é bastante clara quanto ao teor intervencionista estatal em matéria de disciplina e competições esportivas, assim como no empoderamento desmedido de dirigentes perante os julgamentos de atletas e árbitros.

E é nesse tema que continuo a escrever pelos próximos números, buscando ainda revelar lances inéditos e importantes aos amantes do Direito Esportivo.

Agradeço mais uma vez ao jornalista e advogado Andrei Kampff, criador do portal, por esta oportunidade magnífica que tenho tido de contato direto com leitores tão qualificados.

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