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Violência em Santos x Corinthians reacende debate sobre impunidade na Justiça

O clássico entre Santos e Corinthians, pela Copa do Brasil, na noite desta quarta-feira (13), acabou sendo manchado por cenas de violência. Ao final da partida, houve arremesso de bombas e sinalizadores, invasão de campo e tentativa de agressão aos jogadores do Timão. Oito torcedores do Peixe foram detidos, mas acabaram sendo liberados após prestarem depoimento. Infelizmente esse tipo de situação se repete constantemente no futebol brasileiro, e a pergunta que fica é:  por que quase nunca esses infratores acabam punidos peja Justiça?

“Diferentemente do que entende a sociedade de modo geral, há, sim, punição às pessoas que praticam condutas como essas. É preciso que a questão seja analisada sob a ótica do que traz a nossa legislação. Ainda que não haja prisão, as penas restritivas de direito também representam uma reprimenda ao autor do delito. Em relação à invasão ao campo (local restrito aos jogadores), o Estatuto de Defesa do Torcedor (Lei nº 10.671/2003), por meio do art. 41-B, torna essa conduta penalmente punível. No entanto, a pena máxima que pode ser aplicada ao crime é de 2 anos de reclusão, que pode ser convertida em pena impeditiva de comparecimento às proximidades do estádio, bem como a local que se realiza evento esportivo, pelo prazo de 3 meses a 3 anos, de acordo com as circunstancias e condições verificadas no caso analisado”, acrescenta Cecilia Melo, advogada criminalista.

João Paulo Martinelli, advogado especializado em direito penal, explica que o crime de invadir o gramado (promover tumulto, praticar ou incitar a violência, ou invadir local restrito aos competidores em eventos esportivos), que está no art. 41-B do Estatuto do Torcedor, tem pena de 1 a 2 anos de prisão, portanto, é crime de menor potencial ofensivo.

“Ainda, a competência para processar e julgar é do Juizado Especial Criminal, conhecido como ‘Jecrim’ e regido pela Lei 9.099/95. Nos termos do art. 76 da referida lei, o representante do Ministério Público poderá propor aplicação da pena restritiva de direitos, cujas condições serão propostas ao autor do crime por meio da chamada ‘transação penal’”, diz a advogada.

“A Lei 9.099/95 permite a transação penal, que é um acordo entre o Ministério Público e o acusado, que, se aceitar, deve prestar uma obrigação imposta para não ser processado criminalmente. Sequer há processo. Se houvesse a invasão mais agressão (lesão corporal), teríamos concurso de crimes e a transação penal não seria possível. Se o torcedor beneficiado com a transação penal voltar a praticar o delito, não terá direito a outra transação e, portanto, haverá processo”, complementa Martinelli.

“Como se trata de uma infração leve, o MP pode propor uma transação penal, na qual, em troca da extinção do processo, os acusados, se aceitarem a proposta estarão impedidos de se aproximar de nenhum estádio, seja no local da infração ou em outra cidade, pelo prazo de 6 meses; comparecer à Delegacia de Polícia, duas horas antes e duas horas depois de cada partida de futebol, e prestar serviços comunitários”, explica Renan Gandolfi, advogado especializado em direito penal.

Em entrevista ao ‘ge’, o delegado Cesar Saad, da Delegacia de Repressão aos Delitos de Intolerância Esportiva (DRADE), disse que apesar de terem sido liberados, todos os invasores foram autuados com base no artigo 41-B do Estatuto do Torcedor.

Agora, esses infratores serão julgados e, caso sejam condenados, um ofício será enviado para a Federação Paulista de Futebol (FPF) e Polícia Militar com o objetivo de proibir a entrada deles aos estádios.

Importante dizer que o goleiro Cássio, do Corinthians, agredido pelo primeiro torcedor que invadiu o gramado, disse que não pretende prestar queixa sobre o episódio.

Punições na Justiça Desportiva

Se comparado com alguns anos atrás, podemos dizer que hoje a Justiça Desportiva pune com mais rigor casos de violência nos estádios. Multas, portões fechados, perda de mandos e pontos são algumas das punições previstas no Código Brasileiro de Justiça Desportiva (CBJD) para infrações dessa natureza a depender da gravidade.

O advogado Vinícius Loureiro, especialista em direito desportivo e colunista do Lei em Campo, diz que os torcedores passaram a ter um papel de “fiscalizador” as atitudes dos demais, buscando evitar punições para seus clubes.

“Os casos de invasão e violência dentro dos estádios nos dias de hoje são bastante mais raros que outrora. Isso se deve em parte à eficiência da Justiça Desportiva enquanto órgão julgador, não apenas por sua velocidade, mas também pela natureza das penas impostas. Os próprios torcedores passaram a fiscalizar as atitudes dos demais, de forma a evitar que o clube perdesse mandos de campo e eles, torcedores, fossem impedidos de assistir às partidas. Essa combinação de punição efetiva e controle social se mostrou capaz de reduzir de forma significativa o problema da violência dentro das praças esportivas. Esse problema infelizmente não foi reduzido de forma geral, mas transferido para fora dos estádios, muito em razão da ineficiência do Estado em coibir tais ações de forma efetiva e do temor social em denunciar tais atitudes”, afirma.

Para Vinicius Loureiro, casos como esses de ontem, graves e de repercussão nacional, é fundamental que haja uma resposta exemplar por parte da Justiça Desportiva, evitando que novos episódios desse tipo sejam praticados.

“Nos últimos tempos, no entanto, temos observado um crescimento da permissividade da Justiça Desportiva com situações absolutamente reprováveis, como as observadas na partida entre Santos e Corinthians. Caso a sensação de abrandamento ou redução da eficiência da Justiça Desportiva cresça, é possível que vejamos também uma redução do autocontrole dentro das torcidas e, com isso, podemos voltar a ver episódios lamentáveis com maior frequência. Em casos como esse, graves e de repercussão nacional, é fundamental que a resposta da Justiça Desportiva seja exemplar, obviamente dentro dos limites e parâmetros legais”, finaliza.

Que punições o Santos pode sofrer na Justiça Desportiva?

Especialistas consultados pelo Lei em Campo dizem que é praticamente certo que o Alvinegro será punido pelas cenas assistidas nesta quarta-feira.

O advogado Gustavo Lopes, especializado em direito desportivo e colunista do Lei em Campo, entende que “invasão de campo deve gerar multa e perda de mando de campo, segundo o CBJD. E, segundo Estatuto do Torcedor, apesar de improvável, a Vila Belmiro pode até ser interditada”.

Carlos Henrique Ramos, advogado especializado em direito desportivo e colaborador do Lei em Campo, explica por que a pena deve ser grave.

“Como houve invasão de campo, lançamento de bombas e tentativa de agressão após a partida, o Santos (equipe mandante) pode ser enquadrado nos arts. 211 e 213 do CBJD. O primeiro diz respeito a deixar de manter o local da partida com infraestrutura necessária a assegurar garantia e segurança para sua realização (multa de cem reais e cem mil reais e interdição da praça esportiva, quando for o caso), ao passo que o segundo se refere a deixar de tomar providências capazes de prevenir e reprimir desordens, invasão de campo e lançamento de objetos (multa de cem reais a cem mil reais).  Por fim, nos termos do § 1º do art. 213, caso a Procuradoria entenda que evento foi de elevada gravidade, a denúncia pode incluir a eventual punição de perda de mando de campo de uma a dez partidas”, analisa.

Crédito imagem: Fernanda Luz/AGIF

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