Lei nº 9.615/1998
Art. 2º. O desporto, como direito individual, tem como base os princípios:
[…]
XI – da segurança, propiciado ao praticante de qualquermodalidade desportiva, quanto a sua integridade física, mental ou sensorial;
Causaram revolta as imagens de uma invasão de bárbaros, travestidos de torcedores, no estádio Orlando Scarpelli no dia 5 de setembro de 2020.
De acordo com reportagem de Ivana Negrão para o Lei em Campo[1], o estádio do Figueirense foi invadido enquanto 34 atletas do clube realizavam treino regenerativo. Os criminosos pularam o muro, derrubaram um dos portões do estádio e se dirigiram aos atletas com rojões.
No mesmo dia, já circulava no twitter o depoimento emocionado da nutricionista do clube, Cíntia Figueiredo que bradou: “Nós estávamos trabalhando. A gente trabalha para ter resultado positivo, mas nem sempre consegue. Quem está lá tem dignidade, tem família e merece respeito. Não podemos ser covardemente agredidos física e moralmente, porque um bando de desocupados se acha no direito de nos bater e quebrar o nosso patrimônio. Isso tem que acabar. Essa história de torcedor ou de qualquer um achar que pode botar o dedo na cara de quem trabalha com futebol e dizer como as coisas têm que ser, sem respeito, tem que acabar!”.
De fato, não é admissível que no seu ambiente de trabalho, o empregado sofra qualquer tipo de violência. Com efeito, o clube empregador, em que pese também ser vítima, tem a obrigação de assegurar a integridade física de seus atletas.
O art. 2º, XI da Lei Pelé é categórico ao afirmar que desporto, como direito individual, tem como base o princípio da segurança, propiciado ao praticante de qualquer modalidade desportiva, quanto a sua integridade física, mental ou sensorial.
Em relação ao Brasil é sabido que o maior problema está ligado à educação, sendo que a violência manifestada no futebol não é apenas produto do que acontece nos estádios. Em 2015 foi apresentada pesquisa feita pela ONU em 127 países na qual o Brasil figurou em um desonroso 1º lugar no ranking de escolas com o ambiente mais violento, com índices crescentes de depredação e vandalismo, bullying e agressões múltiplas[2].
Em outros países, episódios de violência desta natureza também pode ocorrer. No ano de 2018 o Sporting Clube de Portugal, tradicional clube de Lisboa, teve o seu centro de treinamento invadido por “torcedores” e muitos atletas foram agredidos fisicamente. Dois anos depois, quarenta torcedores do clube foram condenados a penas de prisão variadas.
Nas corridas de cavalos realizadas no Circo Máximo em Roma (que tinha capacidade para 150.000 espectadores), eram registrados episódios de violência entre os torcedores de factiones rivais, que eram representadas por cores diferentes. De acordo com Javier Ramos, em Constantinopla, uma disputa entre factiones terminou com mais de 3.000 mortos[3].
De acordo com Mauricio Murad[4] a violência no futebol tem sua origem em questões bem mais profundas. A saber: desemprego, subemprego, falta de uma educação efetiva e de qualidade, falta de consciência social, tráfico de drogas, contrabando de armas, crime organizado, descaso das autoridades competentes, desagregação das referências e dos valores familiares e escolares, falta de policiamento ostensivo e primitivo, impunidade e corrupção.
A sensação de impunidade é cruel, na medida em que os bandidos se sentirão estimulados a perpetuar suas condutas sem qualquer tipo de repressão.
Nada obstante, cumpre ressaltar que a Lei n. 13.912/2019, alterou o Estatuto do Torcedor (Lei nº 10.671/2003), para ampliar o prazo de impedimento de que trata o art. 39-A, estender sua incidência a atos praticados em datas e locais distintos dos eventos esportivos e instituir novas hipóteses de responsabilidade civil objetiva de torcidas[5].
Portanto, o que resta é identificar os culpados e que que eles sejam julgados e condenados com a celeridade que o caso requer e sob os ditames do rigor da lei, a fim de que o caráter pedagógico da sanção sirva para inibir futuras pretensões de violência.
O nosso estágio atual de civilização não mais permite atitudes grotescas como essas no esporte. Não é admissível que atletas, membros da comissão técnica e profissionais de um clube sejam submetidos a atos de violência, seja física ou moral, em razão de eventual mau desempenho em campo ou qualquer outro fundamento.
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[1] Disponível em: https://leiemcampo.com.br/torcida-invade-treino-e-ameaca-jogadores-do-figueirense/. Acesso realizado em 08.09.2020.
[2] MURAD, Mauricio. A Violência no Futebol. 2ª edição. P. 13
[3] RAMOS, Javier. Isto não estava no meu livro de História de Roma. Ed. Marcador, 2019 – p. 228.
[4] Op. Cit. P. 12
[5] Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2019/lei/L13912.htm . Acesso realizado em 08.09.2020