Semana passada, a Professional Fighters League (PFL), uma das maiores ligas de MMA do mundo, anunciou a compra do Bellator MMA, de propriedade da empresa Paramount[1].
A liga, que se torna a segunda do mundo com a aquisição e é apoiada por aportes financeiros provenientes do governo da Arábia Saudita, desafia a hegemonia do Ultimate Fighting Championship (UFC) no mundo das artes marciais mistas.
A PFL, com sede nos EUA, não divulgou o preço da compra, mas a Paramount manterá uma pequena participação minoritária no Bellator.
A Viacom, antecessora da Paramount, adquiriu o controle acionário do Bellator em 2011 por um preço de US$ 50 milhões. No passado, a empresa ajudou a alavancar o UFC por meio de seu reality show The Ultimate Fighter. Após o acordo da Viacom com o Bellator, o UFC migrou para a Fox Sports e, mais recentemente, fechou um acordo com a ESPN. Atualmente, ele pertence à TKO Group Holdings, que, por sua vez, é controlada pela Endeavor.
A venda do Bellator também ocorre no momento em que a Paramount procura sair do negócio de esportes de combate. No mês passado, ela anunciou que encerraria a Showtime Sports. Como parte dessa mudança, a empresa anunciou que encerraria a transmissão ao vivo de lutas de boxe[2].
A PFL foi fundada em 2017 e é relativamente nova em um esporte em crescimento, mas atraiu um investimento de US$ 100 milhões do fundo soberano saudita em agosto. O investimento foi parte de um plano para expandir a PFL no Oriente Médio, com uma sede regional da liga na Arábia Saudita, que será lançada no próximo ano.
A Arábia Saudita tem reforçado sua presença global nos esportes, investindo em tudo, desde futebol até golfe e tênis. O país, que busca competir com os vizinhos Emirados Árabes Unidos como um centro regional de finanças e logística do Oriente Médio, sediou várias lutas de alto nível nos últimos meses, enquanto os Emirados Árabes Unidos sediaram eventos do campeonato do UFC.
A Arábia Saudita sediou uma luta em outubro entre o campeão dos pesos pesados do boxe, Tyson Fury, e o campeão de MMA Francis Ngannou, que assinou contrato com a PFL, com outras lutas programadas para o próximo ano[3].
O UFC tem estado na vanguarda da popularização das artes marciais mistas, gerando cerca de US$ 1,1 bilhão em receita em 2022, mas está sendo processado por lutadores por causa de salários[4].
Embora seja um nome venerável no mundo das artes marciais mistas, com uma lista que inclui alguns dos melhores lutadores, a audiência do Bellator é menor do que a do UFC.
Segundo o comunicado oficial da PFL, o Bellator continuaria a operar sob sua própria marca, com seu próprio conjunto de regras de luta que permite movimentos como golpes de cotovelo, ao contrário da PFL. No entanto, compartilharia sua lista de lutadores com a PFL.
Há meses circulavam relatos de que o Bellator poderia estar à venda, já que a empresa controladora Paramount buscava cortar custos. O principal pretendente frequentemente ligado a uma possível compra do Bellator era a própria rival PFL.
Outro ponto importante eram as dúvidas sobre como a maior parte do elenco do Bellator poderia ser administrada caso o evento fechasse sem ser adquirido.
No passado, outros eventos de MMA que fecharam as portas passaram por situações deixaram seus atletas em situação complicada.
Em 2008, o EliteXC, evento norte-americano cancelou sua agenda de shows e deixou seus atletas em alerta. A ProElite, empresa controladora do EliteXC e de várias outras promoções, encerrou suas operações e notificou a Comissão Atlética do Estado de Nevada sobre seu fechamento em outubro. No entanto, os representantes do EliteXC prometeram, na época, que continuariam as operações e planejariam eventos para 2009, não permitindo aos seus contratados lutar em outras organizações sem a permissão expressa por escrito do EliteXC. A menos que houvesse uma decisão judicial, os lutadores do EliteXC seriam impedidos de assinar com outra organização.
No ano seguinte, o extinto Strikeforce (mais tarde comprado pelo UFC) anunciou que firmou um acordo de compra de ativos com a ProElite Inc. para adquirir determinados contratos de lutadores e videoteca do EliteXC[5].
No caso do Bellator, pode ter ocorrido o mesmo em relação à negociação dos contratos dos atletas em vigência. Alguns contratos de eventos têm cláusulas[6] que permitem a quebra do compromisso caso não haja dinheiro suficiente para o cumprimento do contrato. No caso, o evento precisa provar que pode cumprir o contrato ou o atleta será um agente livre.
Definitivamente, precisamos de mais detalhes.
É necessário que o MMA esteja sujeito ao Ali Act[7] para proteger os lutadores, que não têm mais a quem recorrer, dos contratos coercitivos do mundo do MMA.
Mesmo com o Ali Act, as organizações de MMA ainda podem ser bem-sucedidas, mas os interesses financeiros dos lutadores também serão protegidos. Isso mudaria fundamentalmente a dinâmica de poder no MMA e permitiria que os lutadores agissem como verdadeiros agentes livres que não são controlados por períodos indefinidos de tempo.
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[1] COMBATE. PFL anuncia compra do Bellator e promete duelos de campeões em 2024. G1. 20 nov. 2023. Disponível em: https://ge.globo.com/combate/noticia/2023/11/20/pfl-anuncia-compra-do-bellator-e-promete-duelos-de-campeoes-em-2024.ghtml. Acesso em: 20 nov. 2023.
[2] WEPRIN, Alex. Showtime Sports to Shut Down Later This Year. The Hollywood Reporter.17 out. 2023. Disponível em: https://www.hollywoodreporter.com/business/business-news/showtime-sports-shut-down-boxing-strategy-shift-1235620873/. Acesso em: 20 nov. 2023.
[3] COSTA, Elthon José Gusmão da. Francis Ngannou e o novo contrato com a PFL. Lei em Campo. 22 maio 2023. Disponível em: https://leiemcampo.com.br/francis-ngannou-e-o-novo-contrato-com-a-pfl/. Acesso em: 20 nov. 2023.
[4] COSTA, Elthon José Gusmão da. Mais uma vitória dos atletas no longo processo contra o UFC. Lei em Campo. 6 nov. 2023. Disponível em: https://leiemcampo.com.br/mais-uma-vitoria-dos-atletas-no-longo-processo-contra-o-ufc/. Acesso em: 20 nov. 2023.
[5] Strikeforce acquires EliteXC assets. MMA FIGHTING. 5 fev. 2009. Disponível em: https://www.mmafighting.com/2009/02/05/strikeforce-acquires-elitexc-assets. Acesso em: 20 nov. 2023.
[6] É a chamada “cláusula de garantia”, que estipula que o evento deve ser capaz de cumprir suas obrigações promocionais e de pagamento decorrentes do contrato ou de qualquer extensão do mesmo, sob pena de quebra do contrato.
[7] A Lei Ali (Ali Act) buscou aplicar a supervisão mais básica em nível federal (se não a aplicação total) das melhores práticas para reduzir a probabilidade de os boxeadores serem explorados por um sistema de governança existente que era tão descentralizado quanto desregulado, opaco e corrupto. Embora a lei não tenha criado um único órgão regulador de cima para baixo para o esporte nos EUA, ela capacitou as comissões atléticas estaduais a estabelecer regras e transparências mais claras em relação a uma lista de fatores, incluindo contratos e garantias de remuneração. A extensão da lei para o atletas de MMA traria as mesmas vantagens para esse profissional.