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A definição legal de prática desportiva profissional

O leitor que acompanha a coluna com alguma assiduidade sabe que o tema de hoje não é novidade por aqui. Aliás, bem ao contrário: na semana passada, tratamos do assunto ao tratar do acórdão proferido pela Comissão Disciplinar do STJD do Automobilismo que aplicou pena de multa ao piloto Gabriel Casagrande. Mas diante da repercussão desse último texto e da importância do tema no âmbito do automobilismo (explicaremos mais adiante), voltamos a abordá-lo de modo a reforçar o melhor entendimento sobre seus conceitos e efeitos perante a Justiça Desportiva.

Começamos pela pergunta que remete ao título do texto: qual a definição legal de prática desportiva profissional? A resposta é objetiva, e se encontra no artigo 3º, §1º, inciso I da Lei nº 9.615/98 (Lei Pelé): a prática desportiva é profissional quando se caracteriza pela “remuneração pactuada em contrato formal de trabalho entre o atleta e a entidade de prática desportiva. Importante notar que o texto legal contempla dois aspectos diferentes e imprescindíveis para essa caracterização. Em primeiro lugar, que o atleta seja remunerado por meio de contrato formal de trabalho; em segundo lugar, que o empregador do atleta seja uma entidade de prática desportiva.

Portanto, se o atleta de alto rendimento não for remunerado pela prática desportiva, ou se for remunerado com base em qualquer outra relação que não contemple a existência de um contrato de trabalho, será considerado como não profissional. Essa conclusão se extrai do inciso II do mesmo art. 3º, §1º da Lei Pelé: a prática nãoprofissional se caracteriza pela “liberdade de prática e pela inexistência de contrato de trabalho, sendo permitido o recebimento de incentivos materiais e de patrocínio.Logo, por lei, não são considerados profissionais osatletas que auferem seus rendimentos exclusivamente por meio de patrocínio, bolsa ou quaisquer outros contratos de natureza civil.

Essa explicação é absolutamente relevante. Afinal, na atual realidade, a prática da maioria dos esportes é pautada pela inexistência de contrato de trabalho entre o atleta e uma entidade de prática desportiva. Especificamente no caso do automobilismo, a importância se revela na medida em que são diversos os casos de pilotos remunerados, por exemplo, diretamente pelos patrocinadores – ou seja, não são remunerados pela equipe, nem a partir de um contrato de trabalho. Logo, aqueles que se enquadram nessa condição são considerados, à luz da Lei Pelé, como atletas não profissionais.

Esclarecido esse primeiro ponto, passamos à segunda questão: em termos práticos, quais as consequências de a atividade desportiva ser praticada de modo profissional ou de modo não profissional? São diversas as repercussões no campo jurídico, e podemos ilustrar por meio de dois pontos importantíssimos para os atletas: lei de incentivo ao esporte e Justiça Desportiva.

A Lei nº 11.438/2006, que estabelece o mecanismo de incentivo fiscal no âmbito do esporte, veda o uso de recursos captados por meio desse mecanismo para remuneração de atletas profissionais (artigo 2º, §2º). O Decreto nº 6.180/2007, que regulamenta a referida lei, ratifica essa proibição e veda o uso de recursos incentivados para “o pagamento de quaisquer despesas relativas à manutenção e organização de equipes desportivas ou paradesportivas profissionais de alto rendimento (…) ou de competições profissionais”. Logo, identificar se a prática desportiva é profissional ou nãoprofissional afigura-se essencial para compreender se o atleta pode, ou não, se beneficiar da lei federal de incentivo ao esporte.

No que tange à Justiça Desportiva, vale lembrar dois importantes dispositivos do Código Brasileiro de Justiça Desportiva (CBJD): (i) o artigo 170, §2º veda a aplicação de penas pecuniárias a atletas de prática não profissional, enquanto (ii) o artigo 182 determina que as penas de outras naturezas previstas no CBJD (como, por exemplo, suspensão) devem ser reduzidas pela metade quando o infrator for atleta não profissional. Portanto, a forma como se dá a prática desportiva é fundamental para determinar as penas aplicáveis a um atleta com base no CBJD.

Assim chegamos à terceira pergunta: pode um atleta cuja prática desportiva é não profissional ser sancionado por órgão da Justiça Desportiva com pena de multa? Não! Em outras palavras, e trazendo a questão para a realidade do automobilismo: se um piloto não é remunerado pela sua equipe com base em contrato de trabalho, não lhe pode ser imposta pena de multa pela Justiça Desportiva com fundamento no CBJD. Este é, por exemplo, o caso dos diversos pilotos remuneradosdiretamente por patrocinadores, sem vínculo trabalhista com a equipe.

Enfim, por isso reiteramos a conclusão exposta na semana passada: a decisão proferida pela Comissão Disciplinar do STJD do Automobilismo no processo envolvendo o piloto Gabriel Casagrande apresenta, no mínimo, uma importante lacuna ao não fazer qualquer referência à sua condição enquanto atleta profissional ou não profissional. Afinal, essa análise seria imprescindívelpara aferir a aplicabilidade da pena de multa que lhe foi imposta, tendo em vista o tratamento diferenciado que o CBJD confere aos atletas de prática não profissional.

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