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A máscara do artigo 18ter em tempo de pandemia financeira no futebol

“O único homem que está isento de erros é aquele que não arrisca acertar.”¹

A busca da vacina contra a pandemia financeira no futebol proposta na coluna da última semana² continua. Mas enquanto seguimos com a pesquisa da solução de proteção que conterá os elementos relacionados à comercialização dos direitos econômicos de jogadores de futebol com investidores, elementos citados na última coluna, sabendo que a utilização de máscara (orientação da OMS) é apenas uma medida paliativa, não podemos nos furtar de observar o artigo 18ter do Regulamento sobre o Status e Transferência de Jogadores da FIFA com um microscópio jurídico.

Para observar o referido artigo, seguindo o tutorial³ de uso microscópio, devemos antes selecionar a lente “objetiva de menor aumento” para colocá-lo na lâmina de visualização sobre a platina de apoio.  No caso dos direitos econômicos, a lâmina é o conceito e a platina é a natureza jurídica destes. Já conceituamos os direitos econômicos como “condicionais direitos à prestação de indenização, pela extinção antecipada unilateral do contrato laboral desportivo ou de formação sem justa causa por parte do jogador, e de compensação, para a cessão em definitivo (distrato do labor desportivo ou contrato de formação somado ao contrato de transferência) ou para a cessão por empréstimo (suspensão do labor desportivo ou formação desportiva somada ao contrato de transferência), visando à transferência, direitos capazes de gerar benefícios econômicos.”⁴ A natureza jurídica destes é direito condicional, ou de forma ainda mais específica, direito creditório condicional.

Salientamos a necessidade da clareza da distinção do conceito e da natureza jurídica dos direitos econômicos para o conceito e a natureza jurídica dos benefícios econômicos, bem como do negócio jurídico que é realizado com tais direitos. Conceituamos os benefícios econômicos como soma de valor pecuniário, com a natureza jurídica de objeto imediato da obrigação de indenização/compensação (sendo o objeto mediato a prestação de indenização/compensação). Já o negócio jurídico realizado tem por conceito transmissão de direitos creditórios, sendo cessão de crédito a sua natureza jurídica. Confundir seria o mesmo que misturar os componentes da lâmina de visualização e da platina de sustentação com os componentes do objeto observado.

Agora colocamos o artigo 18ter na lâmina e sobre a platina para começar a ser analisado:

“18 ter Propiedad de los derechos económicos de jugadores por parte de terceros

Ningún club o jugador podrá firmar un contrato con un tercero que conceda a dicho tercero el derecho de participar, parcial o totalmente, del valor de un futuro traspaso de un jugador de un club a otro, o que le otorgue derechos relacionados con futuros fichajes o con el valor de futuros fichajes. (…)”

De acordo com o tutorial, iniciando a visualização com a “objetiva de menor aumento”, logo a primeira palavra do “título” do artigo ofusca a nossa visão… “PROPRIEDADE”. Em um movimento absolutamente instantâneo, impulsivo e natural, afastamo-nos do microscópio e começamos a refletir sobre o termo. Propriedade? Propriedade? Propriedade?

Em inglês a abreviatura é TPO e a expressão é Third Party Ownershiiiiiiiiiiii…  Ownership? Pro-pri-e-da-de? Prooooo – priiiiiiiii – eeeeeee – daaaaaaa – deeeeeeeee?

Valendo-nos do aforismo do Direito Romano  “Verba cum effectu, sunt accipienda”, que ensina não haver letra morta na lei, é impossível não questionar o motivo e o fundamento da expressão “direitos econômicos” estar vinculada à expressão “propriedade”.  A simples palavra remete a ideia de direito real e não de direito obrigacional.

Em ligeira comparação, no tempo do lampejo da reflexão, o direito obrigacional, creditório ou pessoal, consiste num vínculo jurídico pela qual o sujeito ativo pode exigir do sujeito passivo determinada prestação. É constituído por uma relação de pessoa a pessoa (direito relativo) e tem como elementos: o sujeito ativo (credor), o sujeito passivo (devedor) e a prestação (crédito/débito).  Já o direito real pode ser definido como o poder jurídico, direto e imediato, do titular sobre a coisa. Trata-se da relação jurídica da pessoa na posse, uso e gozo de uma coisa, corpórea ou incorpórea, que é de sua… PROPRIEDADE. Os elementos essenciais do direito real são: o sujeito ativo (proprietário), a coisa (propriedade), e a relação ou poder do sujeito sobre a coisa. Este tipo de direito pode ensejar vínculo perpétuo.

Então… Então… Pense! Pense! Pense!

Será que a visão da FIFA relativa aos direitos econômicos de jogadores ser propriedade é herança do tempo da existência do passe no sistema (derecho de retención), que não se sustenta atualmente na era Bosman, vez que o vínculo desportivo é acessório e, portanto, subordinado ao vínculo laboral, algo que é transitório, nasce e falece como todo direito obrigacional? Será que a matriz teórica do artigo proibitivo do diploma FIFA contém equívocos? E a máscara, peça que cobre parcialmente o rosto, tapando a boca, ocultando a identidade, e também o nariz, dificultando e viciando a respiração, tem ou não tem eficácia? A orientação já foi para não usar, entretanto, mudou. Os riscos da pandemia continuam aumentando. Essa orientação é apropriada?

Certo mesmo é que toda a comunidade do Direito Desportivo deve seguir analisando o objeto de estudo com todas as lentes do microscópio jurídico. A pesquisa e a luta pela vacina estão só começando!

Avante!

“A única maneira de não cometer erros é fazendo nada. Este, no entanto, é certamente um dos maiores erros que se poderia cometer em toda uma existência.”⁵

……….

1 – Albert Einstein

2 – https://leiemcampo.com.br/investindo-na-vacina-contra-a-pandemia-financeira-no-futebol/

3 – https://kasvi.com.br/manuseio-microscopio/

4 – MARCONDES, Luiz Fernando Aleixo. Direitos econômicos de Jogadores de Futebol: Lex Sportiva e Lex Publica. Alternativa Jurídica às restrições de compra e venda de direitos sobre o jogador. Curitiba: Juruá, 2016, p. 118-119.

5 – Confúcio

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