A segunda-feira (2) foi bastante movimentada nos bastidores da Confederação Brasileira de Futebol (CBF). Uma decisão judicial proferida no começo da tarde pelo desembargador Luiz Umpierre de Mello Serrá, da 19ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça, aceitou o recurso da entidade brasileira e derrubou a decisão de 1ª instância da Justiça do Rio que invalidava o pleito que levou Rogério Caboclo à presidência, em 2018.
A decisão saiu minutos após o presidente do Flamengo, Rodolfo Landim, e da Federação Paulista de Futebol (FPF), Reinaldo Carneiro Bastos, assinarem o termo em que aceitavam a nomeação do juiz de 1ª instância Mário Cunha Filho para serem interventores na CBF. Caso a situação fosse mantida, novamente a confederação brasileira correria sérios riscos de punição na FIFA, uma vez que a entidade que rege o futebol mundial não permite a intervenção da Justiça Comum em federações nacionais.
“Há previsão expressa no Estatuto FIFA que veda a interferência da Justiça Comum perante as federações e eventual descumprimento das disposições do Estatuto FIFA podem excluir o Brasil de disputar as competições organizadas pela FIFA”, afirma Ana Mizutori, advogada especializada em direito desportivo.
Vinicius Loureiro, advogado especialista em direito desportivo, explica que nesses casos, “existe a possibilidade de punição por parte da FIFA, que pode resultar em exclusão da seleção nacional e dos clubes de todas as competições internacionais das quais estejam participando. Ainda que seja improvável neste momento, pelo teor da decisão e da relevância do Brasil no cenário internacional do futebol, é possível que a interferência estatal na confederação traga consequências esportivas”.
O Lei em Campo já mostrou casos em que a FIFA puniu associações pelo mesmo motivo. Seleções mais conhecidas como Nigéria e Grécia foram punidas com suspensão por interferência de terceiros. No caso da federação grega, a sanção se deu logo após a seleção conquistar a Euro, em 2002.
No começo deste ano, em maio, o Conselho de Ética da FIFA suspendeu as federações do Chade, por interferência governamental, e do Paquistão, por violação aos estatutos e regulamentos da organização que rege o futebol mundial. Em 2017, a Federação do Mali de Futebol (FEMAFOOT) foi punida pela entidade após interferência do governo.
Na prática, ao serem punidas, as seleções das respectivas federações são proibidas de participar de competições internacionais. Membros que fazem parte dessas organizações também não podem se beneficiar de programas de desenvolvimento, curso ou treino da FIFA.
Tais decisões demonstram como a FIFA busca assegurar a autonomia de suas federações membros.
Entenda o caso
Na última segunda-feira (26), a Justiça do Rio de Janeiro decidiu anular a Assembleia Geral da CBF (Confederação Brasileira de Futebol) que alterou a forma de votação para a presidência da entidade. Com a decisão, o pleito que colocou Rogério Caboclo no comando da confederação, em abril de 2018, foi anulado.
Na ação, que foi obtida pelo Lei em Campo, o juiz Mario Cunha Olinto Filho, da 2ª Vara Cível da Barra da Tijuca do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, nomeou o presidente do Flamengo, Rodolfo Landim, e o presidente da FPF (Federação Paulista de Futebol), Ronaldo Carneiro Bastos, como interventores, eles ficaram responsáveis por comandar a CBF por 30 dias até que uma nova eleição seja organizada. Nenhum deles poderá concorrer ao cargo.
A Justiça ainda determinou que os interventores convoquem o colégio eleitoral da CBF – formado pelas 27 federações estaduais e clubes da Série A – para votarem sobre a alteração do estatuto da entidade em 2015. As principais discussões são sobre o peso nos votos e a cláusula de barreira para registro de candidatura à presidente da confederação.
É preciso deixar claro que a ação, um pedido do Ministério Público, não contesta o pleito em si, mas sim a Assembleia Geral da CBF que determinou as regras da votação. Para a entidade, a eleição não pode ser anulada, uma vez que a ação foi protocolada na Justiça um ano antes do pleito, em 2017.
Toda discussão começou em março de 2017, quando a CBF promoveu uma assembleia geral, que não contou com a participação dos clubes, e definiu novas regras para suas eleições. O Colégio Eleitoral da entidade passou a ser formado pelas 27 federações estaduais de futebol, os 20 clubes da Série A e os 20 clubes da Série B do Brasileiro.
Buscando ‘manobrar’ a maioria dos clubes, a entidade estabeleceu que os votos das federações estaduais teriam peso 3, os votos dos clubes da Série A teriam peso 2 e os votos dos clubes da Série B teriam peso 1. Dessa forma, se as 27 federações escolhessem o mesmo candidato, ele teria 81 votos, contra 60 votos dos clubes somados.
No pleito que ocorreu em abril de 2018, já levando em consideração a mudança, Rogério Caboclo venceu a eleição com 135 votos. Desses, apenas Flamengo, Corinthians e Athletico não votaram no dirigente que hoje está afastado da presidência por conta da denúncia de assédio moral e sexual de uma funcionária da entidade.
Para a CBF, a eleição não pode ser anulada, uma vez que a ação foi protocolada na Justiça um ano antes do pleito, em 2017. Além disso, a entidade cita que por ser privada, sua eleição não pode ser rejeitada pela Justiça, alegando autonomia de organização e funcionamento prevista na Constituição.
“A maior consequência para a entidade máxima de administração do desporto brasileira é a instabilidade jurídica. A desordem que tem se verificado na CBF segue com desdobramentos preocupantes não apenas para a modalidade esportiva que organiza, mas para a credibilidade do esporte como um todo. O esporte se movimenta e cresce junto com os parceiros comerciais que nele investem, além da atratividade do público. Situações como esta afetam as relações comerciais, desgastam a relação com o público torcedor”, finaliza Ana Mizutori.
Crédito imagem: AFP
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