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Como será pago o direito de arena do time visitante?

Já tivemos a oportunidade de tratar nesta coluna as mudanças introduzidas pela Medida Provisória n.º 984, em vigor no ordenamento jurídico brasileiro desde o dia 18 de junho de 2020[1].

No artigo de hoje falaremos especificamente do direito de arena e daqueles que serão destinatários da rubrica, tendo em vista que a Lei Pelé foi modificada para estabelecer que serão distribuídos, em partes iguais, aos atletas profissionais participantes do espetáculo, 5% da receita proveniente da exploração de direitos desportivos audiovisuais, como pagamento de natureza civil, exceto se houver disposição em contrário constante de convenção coletiva de trabalho.

Desta forma, cumpre destacar que a lei é cristalina no sentido de determinar que todos os atletas profissionais que participarem do espetáculo farão jus ao rateio do direito de arena.

Se a vontade do legislador não fosse esta, haveria a limitação do direito aos atletas do clube mandante, o que não foi o caso.

Até entrada em vigor da MP 984 prevalecia a redação no sentido de que 5% da receita proveniente da exploração de direitos desportivos audiovisuais eram repassados aos sindicatos de atletas, que detinham a obrigação de distribuir, em partes iguais, aos atletas profissionais participantes do espetáculo.

É importante relembrar que durante o período em que os sindicatos ficaram responsáveis por receber o valor e fazer o repasse aos jogadores (de 2011 a 2020), muitas foram as irregularidades denunciadas em razão de práticas estabelecidas por determinados sindicatos, como por exemplo, cobrança de “taxa” de 10% do direito de arena arrecadado para “manutenção” da entidade sem a realização de uma regular assembleia e aplicação de valores em investimentos bancários[2].

Tal fato demonstra que o recebimento dos valores de direito de arena nunca foi tarefa simples para os atletas e de acordo com a nova redação legal, a via-crúcis poderá continuar.

Com efeito, a medida provisória poderia ter sido mais explícita acerca da forma de pagamento do direito de arena para os atletas do clube visitante. Contudo, não se pode perder de vista que não poderá haver distinção entre os atletas profissionais que tiveram suas imagens veiculadas durante o espetáculo, até mesmo porque a Constituição Federal é expressa ao afirmar que é assegurada[3] a proteção às participações individuais em obras coletivas e à reprodução da imagem e voz humanas, inclusive nas atividades desportivas. Logo, a proteção à reprodução das imagens em competições desportivas é garantia de todos os atletas, independente da qualidade de mandante do time.

Convém relembrar, sucintamente, no que consiste o direito de arena.

No livro Manual de Direito do Trabalho Desportivo[4], tive a oportunidade de manifestar que o direito de arena teve sua gênese com advento da Lei n°. 5.988/1973, que regula os direitos autorais. O artigo 100 da referida lei, determinou que o direito de autorizar ou proibir a transmissão ou retransmissão do espetáculo desportivo pertence a entidade de prática desportiva, no caso o clube de futebol, que repassaria 20% (vinte por cento) do preço total da autorização aos atletas participantes do espetáculo. (isso mesmo! Até o ano de 2011, a redação da Lei Pelé previa o pagamento deste percentual).

O espetáculo proporciona aos atletas, como seus protagonistas, a exibição pública e, de forma conexa, agregada ou vizinha dos direitos autorais, o direito de exploração econômica da imagem.

O vocábulo arena é de origem latina e significa parte do palco, piso do anfiteatro, coberto de areia, no qual os gladiadores faziam o seu espetáculo, enfrentando-se entre si ou contra animais.

Atualmente trata-se de instituto jurídico específico aplicável às atividades desportivas.

Um dos componentes do dos direitos da personalidade é o direito de imagem, enquanto o direito de arena é uma espécie de direito de imagem (e neste está compreendido), consistindo na veiculação da imagem do atleta enquanto participante do espetáculo em jogos televisionados.

É decorrente da participação do profissional de futebol em jogos e eventos desportivos e está diretamente relacionado com a prestação do trabalho do atleta no período em que está em campo, apresentando-se na “arena” e não apenas ao uso de sua imagem.

Conforme mencionado no início do presente artigo, a própria Constituição Federal assegura o pagamento desta parcela em seu capítulo que trata das garantias fundamentais.

Uma das formas de assegurar o pagamento a todos os atletas, conforme previsão contida na MPV 984, seria inserir a obrigação legal no regulamento geral das competições, preferencialmente com previsão específica de quantidade e horário das transmissões televisivas. Assim, o clube que descumprisse a determinação, prevista na lei e disciplinada no regulamento, poderia ser denunciado, perante a Justiça Desportiva, por descumprimento de norma do campeonato.

É fundamental que seja preservada a possibilidade de captação das imagens para flagrantes informativos e jornalísticos, com limite de tempo em relação a duração total da partida, sem que tal fato gere qualquer ônus.

Na hipótese de o atleta não receber o valor a que faz jus, poderá demandar judicialmente perante a Justiça do Trabalho. Explico: tendo em vista que a relação de emprego é mantida com o seu clube empregador, poderá haver a formação de um litisconsórcio passivo formado pelo clube empregado e o clube visitante responsável pelo repasse da verba em comento. Nesta hipótese, o clube empregador (visitante) terá todo o interesse que o clube adversário (mandante) pague a parcela devida para cada um dos atletas.

É importante frisar que a matéria é muito nova e ainda não se sabe se a MP será convertida em lei. Porém, de qualquer maneira, já terá produzido os seus efeitos durante o seu período de vigência. Outrossim, o ajuizamento de demanda perante a Justiça do Trabalho e nestas condições, trata-se de uma reflexão inicial, tomando por base a necessidade de atribuir efetividade ao texto legal.

Não seria injusto se estabelecer a possibilidade de se fixar percentuais diferenciados para os atletas dos clubes mandante e visitante. Contudo, por força da própria previsão constante na Constituição Federal, ambos devem ser contemplados, tal como observou a MP 984.

……….

[1] Disponível em: https://leiemcampo.com.br/a-mp-984-as-emendas-e-a-autonomia-desportiva/. Acesso realizado em 14.07.2020

[2] Neste sentido a matéria de 2017 disponível em https://globoesporte.globo.com/sp/futebol/noticia/sindicato-de-sp-retem-dinheiro-que-deveria-repassar-a-jogadores-dizem-advogados.ghtml. Acesso realizado em 14.07.2020

[3] Art. 5º XXVIII da CF

[4] VEIGA, Mauricio. Manual de Direito do Trabalho Desportivo.3ª edição, 2020. Editora LTr, São Paulo – p. 297.

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