A data internacional em homenagem à mulher se deve a um contexto de desigualdade e violência de gênero vivenciado ao longo da história.
Todos os anos, no Dia Internacional de Mulher, muito se fala dos direitos das mulheres, prementes e conquistados ao longo das últimas décadas.
Os avanços legislativos, as normas de proteção à mulher e igualdade de gênero, bem como políticas públicas e incentivos privados de oportunidades de desenvolvimento e inserção da mulher em todas as áreas da sociedade, teve norteia-se no princípio da dignidade da pessoa humana, e através dessa premissa, enunciou esses direitos em sucessivos marcos internacionais, por meio de convenções, acordos e leis¹ .
A igualdade de gênero foi inserida como direito fundamental na Carta das Nações Unidas, em 1945, o que movimentou organismos internacionais a promoverem mecanismos para efetiva inserção dos direitos relacionados às questões de gênero.
A partir deste contexto, em 1946, anos antes de se firmar a Declaração Universal dos Direitos Humanos, (1948), criou-se a Comissão sobre o Status da Mulher (Commission on the Status of Women – CSW), com objetivo específico de assegurar a efetividade dos direitos tutelados às mulheres, tal como sucedeu a Convenção dos Direitos Políticos das Mulheres (1952), estabelecendo a todo e qualquer indivíduo sujeito de direitos universais.
Sob a ótica de direitos fundamentais universais, firmou-se a Declaração sobre a Eliminação de Todas as Discriminações contra a Mulher, em 1967, interpelando práticas como mutilação genital feminina, casamento forçado e violência à mulher, como uma preocupação de ordem social.
Dentre as expressivas mobilizações, notáveis planos de ações foram delineados na Conferência Mundial das Mulheres, realizada no México em 1975, com o apoio da Comissão sobre o Status da Mulher, visando promover mecanismos efetivos para atenuar a desigualdade de gênero em todas as suas formas.
Ampliando os questionamentos, a notória disparidade de acesso e fornecimento de recursos materiais e sociais às mulheres, entre outras causas de discriminação de gênero foram pontualmente debatidas na Convenção Sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminações, 1979.
Na sequência, formaram-se comitês para o salvaguardar a efetiva implementação das medidas debatidas em 1975, a fim de empreender a mulher em âmbitos acadêmicos, profissionais, esportivos, o que ocorreu em nas Conferências Mundiais das Mulheres em Copenhague (1980) e em Nairóbi (1985).
Em 1994, a Conferência Internacional de População e Desenvolvimento realizada no Cairo alcançou debates sobrea os direitos reprodutivos e sexuais das mulheres, e no ano seguinte, além da abordagem sobre desemprego e outras questões sociais debatidas e tratadas na Cúpula Mundial para o Desenvolvimento Social, na Dinamarca, houve também a marcante Conferência Mundial da Mulher, em Pequim, com expressiva participação feminina debatendo os mais amplos temas, onde puderam ser propostos planos de ação com base no desenvolvimento, na igualdade e na paz.
Aludidos debates foram reproduzidos no Consenso de Montevidéu, em 2013, e em Nova Iorque, em 2015, evidenciando e fortalecendo a premissa de “os direitos humanos das mulheres como sendo universais, independentes, inalienáveis e indivisíveis” ².
O encadeamento trazido acima importa na semana em que se comemorou o Dia Internacional da Mulher para que não se olvide das conquistas obtidas e dos caminhos que se abriram. A despeito dos referidos progressos, há muito que avançar, principalmente no que se refere à imperativa e efetiva implementação das medidas, para que a realidade coadune com o que vem sendo pontuado, debatido e normatizado.
Além do longo caminho de reconhecimento e efetivação de organismos internacionais, cabe ressaltar as legislações nacionais que refletem o movimento de proteção à mulher e a igualdade de gênero, tal como a “Lei 9.504/1997: Estabelece normas para as eleições; Lei 10.778/2003: Lei da Notificação Compulsória dos casos de violência contra a mulher que forem atendidos em serviço de saúde pública ou privada; Lei 11.340/2006: Lei Maria da Penha, cria mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher; Lei 12.015/2009: Dispõe sobre os crimes contra a dignidade sexual; Lei 12.034/2009: Altera lei 9.504/1997, e inclui como objetivo promover e difundir a participação política feminina (entre outros); Decreto no. 7.393/2010: Dispõe sobre o funcionamento do Ligue 180 – Central de Atendimento à Mulher; Decreto no. 7.958/2013: Estabelece diretrizes para o atendimento às vítimas de violência sexual pelos profissionais de segurança pública e da rede de atendimento do Sistema Único de Saúde; Lei no. 12.845/2013: Dispõe sobre o atendimento obrigatório e integral de pessoas em situação de violência sexual; Decreto no. 8.727/2016: Dispõe sobre o uso do nome social e o reconhecimento da identidade de gênero de pessoas travestis e transexuais no âmbito da administração pública federal direta, autárquica e fundacional; Emenda Constitucional no. 72/2013: Estabelece a igualdade de direitos trabalhistas entre os/as trabalhadores/as domésticos/as e os/as demais trabalhadores/as urbanos e rurais; Lei no. 13.104/2015: Altera o art. 121 do Código Penal, para prever o feminicídio como circunstância qualificadora do crime de homicídio, e o art. 1o da Lei de Crimes Hediondos, para incluir o feminicídio no rol dos crimes hediondos; Lei Complementar no. 150/2015: Dispõe sobre o contrato de trabalho doméstico.”³
E como não poderia deixar de constar nesta coluna, vale destacar no âmbito desportivo, uma importante mudança no Regulamento FIFA. Em linha a todo movimento explanado aqui neste texto.
Proposto pelo Comitê de Participante do Futebol da FIFA, o Conselho da Fifa incluiu mudanças quanto às regras de licença maternidade de atletas de futebol.
Apesar de parte da legislação trabalhista e do ordenamento jurídico europeu já contar com a normativa específica à gestante, a entidade de administração desportiva preocupou-se em estabelecer um padrão mínimo global para as atletas de seus 211 países-membros, e em linha com o Convênio nº 183 da OIT, passando a estabelecer em seu Regulamento sobre o Estatuto e a Transferência de Jogadores (RSTP), o direito a licença maternidade de 14 semanas, sendo pelo menos oito semanas após o nascimento da criança, além de garantir às atletas e treinadoras de futebol que tenham firmado contrato com a entidade de prática desportiva empregadora, o recebimento de no mínimo dois terços do salário, durante referido período, salvo disposição mais benéfica prevista em legislação nacional.
O futebol feminino espanhol conta com um acordo coletivo firmado junto ao sindicato e agremiações desportivas para ampliar as proteções à atleta gestante, garantindo renovação automática de uma temporada, e medidas para combater a discriminação pela gestação.
O colunista e mestre Rafael Teixeira Ramos explicou com detalhes o conceito e regras sobre o a licença maternidade em âmbito nacional.
As novas regras permitem também a possibilidade de prestação alternativa de serviço ao clube, que seja compatível com a sua condição gravídica, ocasião em que a atleta ou treinadora poderá receber seu salário integral, além de possibilitar a inscrição provisória de atleta fora da janela de transferências, de forma a contribuir com a substituição da atleta que se afastou pela licença maternidade, e para que possa ser registrada em seu retorno, ainda que fora do aludido período, entre outras obrigações impostas ao clube empregador a fim de assegurar o retorno adequado da atleta.
Entretanto, como mencionado acima, não bastam textos escritos ou letras impostas em acordos internacionais ou regulamentos associativos. A efetiva implementação de direitos à mulher, em todas os seus aspectos e esferas decorre do premente enfrentamento da realidade, buscando equilibrar as disparidades, acertar os desníveis e disparidades que ultrapassam e desviam de muitas das recomendações e normas impostas.
No caso do esporte, não bastam as previsões em regulamento internacional e nacional, se para aplicação destes se faz necessária a existência de contratos de trabalho. Ou seja, não basta haver previsão legal, recomendações protecionistas, se a realidade não alcança e não corresponde à tais preceitos.
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1-Convenção Interamericana Sobre a Concessão Dos Direitos Civis à Mulher (1948), Convenção sobre os Direitos Políticos da Mulher (1953), Convenção da OIT que ocorreram ao longo dos anos de 1951, 1952, 1958, 1981, Conferência Mundial sobre a Mulher (Cidade do México,1975), Convenção para Eliminar todas as formas de Discriminação contra a mulher (1979), Conferência Mundial sobre a Mulher (Copenhague, 1980), Conferência Mundial sobre a Mulher (Nairóbi, 1985), Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher – Convenção de Belém do Pará (1995), IV Conferência Mundial sobre a Mulher (Beijing, 1995), Princípios de Yogyakarta: princípios sobre a aplicação da legislação internacional de direitos humanos em relação à orientação sexual e identidade de gênero (Yogykarta, 2007), Convenção e Recomendação da OIT sobre Trabalho Decente para as Trabalhadoras e os Trabalhadores Domésticos, nº 189 (Genebra, 2011).
2 – https://www.ipea.gov.br/retrato/pdf/190327_tema_i_direitos_humanos_das_mulheres.pdf
3- http://femparpr.org.br/site/2019/11/18/5950/