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Eliminatórias da Copa do Mundo: as dificuldades impostas pela pandemia

Em nosso primeiro texto de 2021 aqui na coluna, alertamos: “mesmo que o ano seja novo, infelizmente é muito provável que a pandemia ainda interfira substancialmente nas mais diversas modalidades esportivas”. Especificamente quanto ao futebol, mencionamos que “possivelmente seguirá precisando se adaptar à pandemia no que tange aos seus regulamentos e protocolos, uma vez que os Estados adotem novas medidas restritivas (conforme nesta semana anunciaram o Reino Unido e a Alemanha) em seus territórios”.

Dois meses depois, infelizmente, deparamo-nos com uma situação muito grave no Brasil. A pandemia de Covid-19 chega ao seu pior momento no país, com o sistema de saúde de diversas unidades federativas no limite de suas capacidades. Além disso, a circulação da “variante brasileira” do vírus acende sinais de alerta não apenas em território nacional mas também no exterior, com crescentes restrições à circulação internacional de pessoas procedentes do Brasil.

Em meio a esse turbilhão, o calendário das eliminatórias da Copa do Mundo 2022 prevê duas partidas da seleção brasileira no fim do mês de março: dia 25, visitando a seleção colombiana; e dia 30, recebendo a Argentina. E nos últimos dias surgiram notícias sobre a forte possibilidade de que diversos jogadores que atuam na Europa não possam integrar a equipe. Isso se deve a exceções criadas pela FIFA em suas normas que regem a liberação de atletas às seleções nacionais, adaptando-as à pandemia de Covid-19.

O tema é tratado pelo Anexo 1 do Regulamento sobre o Status e a Transferência de Jogadores (“RSTP” na sigla da expressão em inglês). A regra geral prevista em seu artigo 1 consiste na obrigatoriedade de que os clubes liberem seus jogadores sempre que convocados pelas respectivas seleções nacionais nas datas do calendário da FIFA reservadas para partidas internacionais (comumente referidas como “datas FIFA”).

Ocorre que, devido à pandemia, em agosto do ano passado a FIFA incluiu regras temporárias no Anexo 1 do RSTP, inicialmente aplicáveis às “datas FIFA” que iam de 31 de agosto a 8 de setembro de 2020 no calendário masculino e 14 a 22 de setembro de 2020 no calendário feminino. Ali se criava a exceção pela qual os clubes poderiam decidir pela não liberação de seus atletas quando:

  • houvesse um período obrigatório de quarenta ou isolamento de cinco ou mais dias no país do clubes ou no país em que seria disputada a partida internacional entre seleções; ou
  • houvesse restrição de viagens envolvendo (isto é, seja para partidas do local ou para chegadas ao local) o país do clube ou o país em que seria disputada a partida internacional entre seleções; e
  • as autoridades locais não concedessem nenhuma isenção específica aos jogadores de seleções nacionais de futebol quanto às regras indicadas nos itens (i) e (ii).

Posteriormente, tendo em vista a continuidade – e mesmo o agravamento, em meio à segunda onda – da pandemia, a FIFA estendeu o período de exceção até o fim de abril de 2021. Assim, além de janelas internacionais dos calendários do futebol feminino e do futsal, as regras acima valem também para as “datas FIFA” do futebol masculino no fim de março. Logo, são aplicáveis às duas próximas partidas a serem disputadas pela seleção brasileira.

Assim, a seleção pode enfrentar problemas. De plano, a possibilidade de que clubes das principais ligas europeias não cedam seus atletas. Como exemplo, destacamos o Reino Unido, que atualmente exige um isolamento de dez dias dos passageiros que lá tenham residência (caso dos jogadores brasileiros que atuam na Premier League) e que tenham visitado Brasil ou Colômbia nos dez dias anteriores à viagem. Portanto, à luz das regras da FIFA em vigor, os clubes da Premier League não estariam obrigados a ceder seus atletas à seleção brasileira. Esse caso, somado a restrições impostas por outros países europeus, já teria despertado a possibilidade de uma seleção formada basicamente por jogadores de clubes brasileiros.

Mas essa alternativa não necessariamente resolve a questão em relação à primeira partida. Em meados de fevereiro, a seleção brasileira de basquete foi impedida de participar de dois jogos das eliminatórias do mundial da modalidade na Colômbia por não poder entrar no país. Diante do flagrante agravamento da pandemia no Brasil desde então, como assegurar que a postura das autoridades colombianas no fim de março seja distinta?

Em circunstâncias normais, nenhuma seleção pode deixar de participar de uma partida das eliminatórias, sob pena de aplicação de sanções do Comitê Disciplinar da FIFA. No entanto, o item 4 do artigo 5 do regulamento da FIFA para as eliminatórias da Copa do Mundo – já modificado com adaptações ao contexto de pandemia – prevê algumas situações como exemplos de casos de força maior que afastariam tais sanções, dentre as quais se destaca a impossibilidade de entrada de uma equipe no país onde se disputaria o jogo. Nesse caso, conforme dispõe o item 6 do mesmo artigo 5, caberá à FIFA tomar as medidas que julgar adequadas, inclusive definindo o possível adiamento da partida.

Enfim, a pouco mais de vinte dias das próximas partidas da seleção pelas eliminatórias, ainda há dúvidas sobre se elas ocorrerão. À luz de todo o acima exposto, mesmo com um calendário já apertado devido a alterações promovidas em 2020, não será de se espantar os jogos forem adiados. Afinal, neste caso, os limites impostos pelas legislações nacionais podem ser intransponíveis diante da complexidade que envolve a reunião e a atuação de uma seleção nacional no futebol globalizado. E, como vimos, a Lex Sportiva contém as ferramentas necessárias para a adoção dessa medida.

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