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Esporte eletrônico: “Obrigações da desenvolvedora – Justiça Desportiva”

Já foi visto aqui no Lei em Campo que as desenvolvedoras e os clubes de esporte eletrônico utilizam ferramentas presentes na legislação esportiva, como o contrato especial de trabalho esportivo entre o atleta e o clube. Entretanto, é possível observar que estão sendo utilizados os bônus, mas não os ônus da legislação esportiva pelas desenvolvedoras. Um desses ônus é a criação de uma Justiça Desportiva.

Justiça Desportiva

A Constituição Federal, no artigo 217, parágrafos 1º e 2º, abarca a existência da Justiça Desportiva, cujo regulamento seria feito por lei. Por sua vez, a Lei 9.615, de 1998, a Lei Pelé, regulou o instituto e passou a entender que “compete às entidades de administração do desporto promover o custeio do funcionamento dos órgãos da Justiça Desportiva que funcionem junto a si” (art. 50, § 4º).

Dessa forma, o estabelecimento da Justiça Desportiva para cada modalidade esportiva é obrigação estabelecida pela Constituição, cuja competência de criação e manutenção é da entidade de administração do desporto, ou seja, das desenvolvedoras. Porém, nenhuma desenvolvedora no brasil criou sua Justiça Desportiva.

Bom para quem?

A Justiça Desportiva tem jurisdição para os assuntos de competição e disciplina, assuntos sobre os quais atualmente as desenvolvedoras tomam decisões e aplicam punições arbitrariamente.

Não é à toa que a Justiça Desportiva existe. Além de oferecer rapidez no julgamento das lides, para não prejudicar competições em andamento, ela também traz paridade de armas em um ambiente em que a administradora do esporte – mesmo os analógicos – tem a maior parte dos poderes políticos.

Por deter a maior parte dos poderes políticos, em seus estatutos, regulamentos e contratos, as desenvolvedoras definem que elas realizarão qualquer investigação, julgamento e execução da pena. E, se não houver Justiça Desportiva, não há ninguém que vigie o vigilante, pois já foi decidido, em um processo judicial, no qual não foi requerida a aplicação da legislação esportiva, que ela tem todo o direito de ser o juiz, júri e executor – estamos falando do Caso Loop.

O Caso Loop

O Caso Loop gira em torno do suposto aliciamento do jogador Caio “Loop” Almeida pelo clube paiN Gaming, no final de 2015. A INTZ, clube que tinha contrato com Loop, fez a denúncia à Riot Games, desenvolvedora que administra o cenário competitivo do jogo League of Legends.

A Riot Games aplicou punições ao clube e ao jogador, proibindo a equipe de inscrevê-lo em campeonatos da temporada 2016. Em processo que correu na 45ª Vara Cível do Foro Central Cível de São Paulo, o clube e o atleta alegam que foram punidos “antes de qualquer apuração oficial” e que houve “frontal e absurda violação à ampla defesa e ao contraditório”, pois não houve nenhuma oportunidade de apresentação de defesa.

O pedido principal era a declaração de nulidade da punição, para que Loop pudesse ser inscrito e competir na temporada 2016. Nenhuma das partes pediu para que a atividade fosse considerada esporte ou que fosse aplicada a legislação esportiva na resolução do conflito.

Tendo o pedido de antecipação da tutela negado, o processo durou mais de um ano, fazendo com que o processo tenha perdido o objeto principal, pois o prazo da punição havia expirado sem a resolução do mérito no processo judicial. O processo foi julgado improcedente, pois o juiz apontou “inexistência de disposição legal ou contratual obrigando a ré à instauração de procedimento formal e/ou “oficial” para a apuração da prática de aliciamento.”

Se existisse Justiça Desportiva

Para qualquer outro clube ou atleta, a mensagem do Caso Loop foi clara: as desenvolvedoras e suas decisões não podem ser questionadas, pois elas têm o poder. E mesmo que questionassem, a duração do processo é mais longa do que a punição.

A mensagem foi clara, mas está incorreta. É necessária a aplicação de uma legislação esportiva para atividades esportivas, pois é esperado que a entidade de administração tenha demasiado poder político e ofereça mecanismos para que haja paridade de armas.

Usando o Caso Loop de exemplo, a Lei Pelé realmente permite que a entidade de administração do desporto aplique algumas sanções, que estão listadas no artigo 48; porém, define também, no § 2º do mesmo artigo, que as sanções de suspensão, desfiliação e desvinculação só serão aplicadas após decisão definitiva da Justiça Desportiva.

Dessa forma, é descabido que as desenvolvedoras gozem das ferramentas da legislação esportiva que tornam seu negócio mais seguro e lucrativo, porém não respeitem aquelas que lhes retirarão poder.

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