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Na pista: quem organiza as competições de automobilismo no Brasil?

Há duas semanas, apresentamos a estrutura federativa básica do automobilismo no país, à luz da Lex Sportiva e do ordenamento jurídico brasileiro. É precisamente dessa estrutura que decorrem as competências para organização de competições. Por exemplo, a Federação de Automobilismo de São Paulo é competente para organizar eventos das diversas modalidades no âmbito de seu estado, e a mesma lógica se aplica às demais federações estaduais em seus respectivos territórios. Em nível nacional, a competência é da CBA. Mas há exceções.

A ressalva no fim do parágrafo anterior é importante, e se explica pela análise do Código Desportivo do Automobilismo, editado pela própria CBA. Consta do artigo 62.2 a exceção que distingue o automobilismo de boa parte dos demais esportes: a previsão em regulamento da possibilidade de que provas e campeonatos oficiais possam ser organizados por terceiros.

Cria-se, assim, a figura da “promotora”, ou seja, aquela a quem a CBA (em nível nacional) ou uma federação (no âmbito de seu estado) outorga o direito de organizar competições. Deste modo, embora tais eventos sejam gerenciados por terceiros (estranhos à estrutura federativa), em função da chancela da CBA ou da federação são disputados em conformidade com as regras (técnicas, desportivas, disciplinares…) por elas aprovadas – além, é claro, das normas da FIA aplicáveis, se houver. Este é o caso, por exemplo, do Campeonato Brasileiro de Stock Car, cuja temporada 2020 teve início no último fim de semana.

Em comparação com outros esportes, trata-se de uma construção não tão comum, visto que se refere à organização da principal (ou, na pior hipótese, uma das mais importantes) competição do país por empresa independente, ou seja, não filiada a qualquer entidade esportiva e não integrante do sistema federativo. Num primeiro momento, seria possível imagina-lo como um campeonato alheio à estrutura federativa da FIA e da CBA, estabelecido de forma paralela e independente; contudo, não é o caso: trata-se de competição efetivamente inserida no sistema federativo, a partir da chancela da Confederação e da aplicação de regulamentos por ela homologados.

Assim, o automobilismo contempla uma interessante variação do modelo federativo tradicional, no qual as mais importantes competições são usualmente organizadas por entidades de administração do desporto ou ligas – ou eventualmente por promotoras, mas com base tão somente em relação contratual, não na própria Lex Sportiva. E os resultados desse modelo revelam-se positivos, tendo em vista a notoriedade e a relevância do Campeonato Brasileiro de Stock Car.

E os eventos organizados fora da estrutura federativa da CBA?

Até então, tratamos exclusivamente das competições inseridas na estrutura federativa da CBA. Mas vale ressaltar que a existência dessa estrutura e das normas nela inseridas não significa que todo e qualquer evento automobilístico seja autorizado ou chancelado por entidades inseridas nesse sistema federativo. Este é o caso, por exemplo, de diversos eventos amadores realizados em todo o Brasil (sobretudo de kart) organizados por pessoas físicas ou jurídicas que não integram a estrutura federativa da CBA nem recebem a autorização prevista no artigo 62.2 do Código Desportivo do Automobilismo.

Nessa hipótese, o automobilismo não se distingue dos demais esportes: embora a Lex Sportiva adote o monopólio como princípio, a legislação brasileira não segue essa linha – vigora o princípio da liberdade de associação, previsto no artigo 5º, inciso XVII da Constituição Federal –, nem cria impedimento à realização de eventos esportivos por pessoas fora da estrutura federativa.

Portanto, independentemente de autorização de entidades de administração do desporto, esses eventos são legais, regidos por seus próprios regulamentos e sujeitos a relações jurídicas válidas junto a terceiros, como pilotos e patrocinadores. Os únicos senões residem justamente na esfera estritamente esportiva, por não se inserirem na estrutura federativa: a possibilidade de aplicação de sanções por entidades que compõem o sistema federativo, ou mesmo o improvável aproveitamento desses eventos para obtenção de determinadas categorias de licença de piloto – e disso trataremos em uma próxima coluna.

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Crédito foto: Unsplash, Pascal Richier.

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