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Nova Lei Geral do Esporte deve acabar com insegurança jurídica relacionada ao tempo do primeiro contrato profissional do atleta

Nesta semana, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva sancionou, com alguns vetos, o projeto que institui a nova Lei Geral do Esporte, o novo marco regulatório do esporte brasileiro. Uma das novidades do texto é de equiparar o tempo do primeiro contrato profissional de menor (que completou 16 anos) com o que é estabelecido pela FIFA.

Atualmente em vigor, a Lei Pelé (Lei 9.615/98) em seu artigo 29 estabelece que a entidade de prática desportiva formadora poderá firmar o primeiro contrato com o atleta, a partir dos 16 anos de idade, cujo prazo não poderá ser superior a 5 anos. Pela nova Lei Geral do Esporte, esse tempo é de até 3 anos, seguindo o que determina o artigo 18 do Regulamento sobre Status e Transferência de Jogadores (RSTJ) da FIFA.

Para o advogado João Paulo Di Carlo, que abordou o tema em sua coluna no Lei em Campo, a Lei Geral do Esporte vem “uniformizar o entendimento com a normativa FIFA, causando mais causando mais segurança jurídica sobre algo que já poderia ocorrer na prática caso existisse a figura de uma equipe estrangeiras, pois atrairia a competência da FIFA para o conflito”.

Essa insegurança jurídica fica clara quando analisamos o Regulamento Nacional de Registro e Transferência de Atletas da CBF (Confederação Brasileira de Futebol), em seu artigo 7º, que segue o entendimento da lei nacional (Lei Pelé), porém ressalva que, em caso de litígio submetido à FIFA, somente serão considerados os três primeiros anos, em conformidade com o artigo 18 do RSTJ.

“Os clubes formadores alegam que o prazo de 3 anos os deixa vulneráveis tratando-se de um jovem de 16 anos, pois exclui alguns anos de sua formação, onde o clube poderia obter recursos com uma possível transferência. Por outro lado, muito embora possa trazer mais estabilidade ao futebolista em início de carreira, um contrato mais longo pode representar uma defasagem salarial diante do rendimento esportivo real do jogador e até uma transferência para clubes estrangeiros, sonho de muitos, a depender do valor da multa, amarrando o atleta ao clube, sob aquelas circunstancias pactuadas inicialmente. Recorde-se que não há limite de valor da cláusula indenizatória para clubes estrangeiros, em atenção ao disposto pelo artigo 28, § 1º, inciso II, da Lei Pelé e também possível Lei Geral do Esporte. É um debate muito interessante para ambas as partes”, afirma João Paulo Di Carlo, especialista em direito desportivo.

Caso concreto que expõe esse conflito de normativas

Um exemplo concreto que envolveu esse conflito de normativas é o do atleta Lucas Fasson, até então menor de idade, que assinou o seu primeiro contrato profissional com o São Paulo, que teria uma duração inicial de 4 anos. Próximo de cumprir os 3 primeiros anos, o jogador, embasado pelo regulamento da FIFA, notificou o clube sobre o seu desejo de terminar o contrato quando completasse o terceiro ano.

Ultrapassada a marca dos três primeiros anos, o futebolista firmou um contrato com o clube La Serena, do Chile. Em seguida, a lide se divide em dois caminhos, que acabam se misturando: o administrativo, com a emissão do Certificado de Transferência Internacional (CTI) e o mérito da questão, que envolve o conflito entre normativas e a possibilidade de pagamento de indenização ao clube por parte do jogador pela suposta quebra contratual.

Para que uma transferência internacional possa ser concretizada e considerada tempestiva, a Federação Nacional do clube de destino do jogador deve requerer o CTI antes do fechamento do mercado.

No entanto, para que ele seja solicitado, o procedimento deve passar por uma primeira etapa, na qual as equipes devem subir na plataforma do Transfer Matching System (TMS) – elaborada pela FIFA para armazenamento de dados das transferências internacionais – as informações e os documentos pertinentes, presente no artigo 4, do anexo 3 do RSTJ, como, por exemplo, a natureza da operação (permanente ou temporária), os nomes dos intermediários dos jogadores/clubes que atuaram nas negociações, os dados bancários, a remuneração do jogador na nova equipe, o mecanismo de solidariedade e a indenização por formação, os dados pessoais do atleta.

Havendo uma congruência de informações e corretude nos documentos, a Federação do país do clube contratante solicita o CTI para a Federação do clube de origem que, não existindo objeções do clube afiliado, expede o CTI, juntamente com o passaporte do jogador e informa se ele possui alguma sanção pendente.

Entretanto, a FIFA adota uma postura mais protetiva em relação aos menores, que detém um procedimento de transferência distinto. A aprovação da operação, que deve estar em conformidade com o artigo 19, passa pelo crivo do antigo Comitê do Status do Jogador, ora parte do Tribunal do Futebol, antes do requerimento do CTI.

Por fim, com a expedição do CTI, o jogador já pode ser inscrito e está apto para atuar. Todavia, em último recurso, uma medida provisória pode ser tomada pela FIFA para que se possa registrar o desportista fora do período estabelecido pela Federação Nacional ou contrariando uma retenção ou mau uso do TMS por uma Federação ou clube. Para tanto, é necessário que o antigo clube tenha adotado um comportamento considerado abusivo, com o condão de ocasionar a ruptura unilateral da relação por justa causa, se recusado a fornecer os documentos ou informações, ou que a Federação do clube de origem tenha se recusado a emitir tal certificado, por exemplo.

No caso de Lucas Frasson, a Federação Chilena solicitou o CTI à CBF, através do TMS, o que foi recusado pela entidade brasileira, posto que o contrato do jogador com o São Paulo ainda estava em vigor, em consonância com o artigo 8º do anexo 3 do RSTJ, que prevê essa possibilidade. Da mesma forma, esse mesmo dispositivo concede a oportunidade à Federação do clube de destino pleitear, junto à FIFA, a expedição provisória do CTI.

Apesar da argumentação da CBF, o Comitê do Status do Jogador concedeu o CTI solicitado pela Federação Chilena para que o jogador pudesse atuar pelo seu clube filiado, ressalvando que essa decisão não analisaria o mérito da suposta ruptura contratual pelo jogador, que já havia sido submetida à Justiça do Trabalho aqui no Brasil.

Inconformado com a decisão, o São Paulo interpôs um recurso junto ao CAS (Corte Arbitral do Esporte), alegando que não havia circunstâncias excepcionais para a concessão do CTI de maneira provisória, bem como a decisão apelada havia ignorado o desejo do clube de continuar na relação laboral com o jogador. Por fim, solicitou que o árbitro único reconhecesse a competência exclusiva da jurisdição da Justiça do Trabalho, em São Paulo, para a resolução do conflito ou, alternativamente, que determinasse o imediato retorno do atleta ou reconhecesse a obrigação do jogador em indenizar o clube pela quebra contratual.

A decisão do CAS referendou a decisão da FIFA pela emissão do CTI, uma vez que o São Paulo não possuía legitimidade ativa para apelar, já que não participou do procedimento em primeira instância. Não podemos olvidar que a emissão e solicitação do CTI representam um ato administrativo que envolve duas Federações, conceito pelo que não se enquadra o clube paulista. Por último, ressaltou que o mérito da questão (terminação precoce do contrato de trabalho) não era alvo da demanda e tão somente a expedição do CTI.

Com a aprovação da nova Lei Geral do Esporte, problemas dessa natureza podem enfim acabar. Isso é o que espera Henrique Law, presidente do Ibrachina FC – clube que desempenha um forte trabalho nas categorias de base e que recentemente obteve seu primeiro certificado de clube formador.

“Infelizmente, as divergências das leis geram conflitos, principalmente se o atleta estiver atuando em um clube de fora, onde provavelmente deve prevalecer a regulamentação da FIFA. No Ibrachina FC, trabalhamos com um contrato profissional de três anos. Seria essencial estabelecer normas compatíveis para que não haja incompatibilidades na formação dos atletas”, contou.

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