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Os bastidores da luta pela igualdade de gênero no esporte

Na semana passada, este espaço do Lei em Campo abordou os aspectos jurídicos em torno das modalidades esportivas feminina, tanto sob a perspectiva da lex publica, da lex sportiva vigente, trazendo o projeto de lei (PL 1.891/22) que visa a equidade de investimentos no esporte.

O tratamento conferido pela FIFA quanto à igualdade de gênero encorajou atletas e fortaleceu movimentos em prol da modalidade feminina dos esportes.

Como parte do resultado da abordagem da FIFA, a Copa do Mundo de Futebol Feminino de 2015, que aconteceu no Canadá, contou com expressiva visibilidade, já que a qualidade das disputas contribuiu para a grande audiência.

Outro reflexo da luta pela igualdade de gênero e da busca pelo fortalecimento da modalidade, a Eurocopa Feminina da Holanda, em 2017, registrou diversas denúncias reportadas por equipes nacionais, manifestando as adversidades deparadas pelas atletas de diversos países.

Em continuidade ao último texto, que trouxe a forma em que a entidade máxima de administração do futebol se posicionou quanto à igualdade de gênero, nesta semana, a abordagem alcança as ações que alentaram o setor esportivo, e como movimentos femininas e inúmeras ações de atletas buscaram reclinar e equiparar o esporte feminino com o masculino, em todos as suas proporções.

Ainda há muito que percorrer, contudo, vale citar a trajetória já explorada globalmente.

Nos Estados Unidos, a Lei de Civil Rights proibia a desigualdade no trabalho em razão de raça, religião, origem social e sexo, mas nada dispunha em relação à educação. Isso impactava diretamente no esporte, uma vez que a prática esportiva no país corresponde a um grande diferencial para o ingresso em programas escolares e universitários. Em 1964, após esforços empenhados por movimentos femininas, passou-se a instituir a igualdade de direitos também na educação (Title IX – Equal Rights Amendment e Education Amendments: No person in the United States shall, on the basis of sex, be excluded from participation in, be denied the benefits of, or be subjected to discrimination under any education program or activity receiving Federal financial assistance”).

Após a alteração legislativa, constatou-se considerável aumento de atletas mulheres no ambiente escolar e universitário.

Apesar do importante avanço, ainda assim, a igualdade estava longe de suceder de fato. Não obstante a “maior audiência da história do futebol no país”, registrada na Copa do Mundo de 2015, na final contra o Japão, “as atletas mulheres recebiam apenas 40% do valor oferecido aos homens para entrar em campo”.

Frente a isso, jogadoras da seleção estadunidense acionaram o Judiciário norte-americano em 2016, para reivindicar seus direitos, requerendo da US Soccer igualdade em relação aos salários pagos aos seus pares. Com a ação, as atletas conquistaram o aumento de 30%. A decisão fundamentou o parcial êxito na demanda afirmando que “mesmo trazendo mais lucro à instituição, as diferenças do bônus pago pela FIFA e das receitas dos clubes – nas categorias feminina e masculina – ainda são muito grandes.”

A esse respeito, vale mencionar que, apesar da discrepância do bônus embolsado pela entidade máxima de administração desportiva, o futebol feminino norte-americano tem receita superior ao masculino em aproximadamente U$ 20 milhões.

Na Noruega, jogadoras exigiram equiparação salarial da Norges Fotballforbund (NFF), entidade de administração do futebol norueguês. A exigência foi atendida, e, para tanto, os atletas da seleção de futebol masculina aceitaram a redução de seus salários. Ainda assim, o bônus pago pela FIFA e UEFA “continuaria a diferir em quinze vezes entre os campeonatos femininos e masculinos”.

O desfecho não foi o mesmo quanto à igualdade salarial reivindicada pelas atletas dinamarquesas por meio de greve. A Federação Dinamarquesa de Futebol optou por não participar das eliminatórias da Copa do Mundo, comunicando que “as jogadoras da seleção não queriam jogar e que, portanto, a partida não seria realizada”, retirando da equipe a possibilidade de disputar o mundial de 2019, na França.

Já na Austrália, a questão foi tratada entre a Federação de Futebol da Austrália e o sindicato que representa as atletas, estabelecendo um piso salarial para as atletas integrantes da liga nacional de futebol.

Mobilizações em busca da igualdade de gênero também ocorreram na Irlanda, Escócia e Nigéria contra as respectivas federações de futebol, perseguindo o progresso em prol das modalidades femininas.

Tais ações colaboram para a instituição de medidas de desenvolvimento, como a “Estratégia Global para o Futebol Feminino”, elaborada pela FIFA em 2018, documento que  estabelece premissas de igualdade de gênero, como a liderança feminina, aprimoramento das competições femininas, crescimento e fortalecimento da modalidade, programas de incentivo, e promoção de maiores parcerias comerciais da categoria.

Sobre parceiros comerciais, vale mencionar que a ADIDAS, patrocinadora da Liga dos Campeões da UEFA (Liga das Nações, e competições femininas – Liga dos Campeões Feminina, Euro Feminina de Futsal, campeonatos feminino sub-17 e sub-19) protagoniza um importante papel na promoção do futebol feminino, promovendo a inclusão e “equidade de oportunidades”, por meio da “Adidas Football Collective”.

A questão é ampla, e ultrapassa aspectos salariais. Trata-se de reconhecimento e valorização da modalidade, em todas as suas formas.

Muito embora os avanços legislativos e a conquista nas previsões nos regulamentos desportivos sobre o tema, a efetividade na igualdade de gênero no esporte submete-se aos esforços de integrantes do movimento desportivo para que as normas sejam factualmente aplicadas também na prática.

Como costumeiramente abordado neste espaço, o esporte corresponde a um poderoso vetor de mudanças positivas na sociedade. O progresso na igualdade de gênero, além de ofertar um importante e valioso produto para o esporte, reflete em outras áreas, onde todos têm a ganhar.

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https://www.gazetaesportiva.com/futebol/futebol-feminino/adidas-e-uefa-estendem-parceria-e-ampliam-compromisso-com-futebol-feminino/ Acessado em 20.08.2022

https://www.oas.org/dil/port/2000%20Declara%C3%A7%C3%A3o%20do%20Milenio.pdf Acessado em 20.08.2022

https://www.nucleodoconhecimento.com.br/ciencias-sociais/igualdade-de-genero

GONÇALVES – Daiane de Oliveira. Principais fatores que influenciam a Desigualdade de Gêneros no Mundo. https://jus.com.br/artigos/66327/igualdade-de-genero-no-mercado-de-trabalho-um-sonho-ainda-distante.

Acessado em 20.08.2022

https://www.onumulheres.org.br/noticias/onu-mulheres-oit-e-uniao-europeia-fortalecem-parceria-com-setor-empresarial-pela-igualdade-de-genero-e-debatem-financiamento-inovador/

MEDONÇA. Greves, ação na justiça e protestos: como jogadoras estão conseguindo mudar a desigualdade de gênero no futebol. BBC – Brasil: 27 out. 2017. Disponível em: https://bbc.in/2XrQ2tL

ALMEIDA. Caroline Soares de. O Estatuto da FIFA e a igualdade de gênero no futebol: histórias e contextos do Futebol Feminino no Brasil. FuLIA /UFMG. 2019.

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