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Responsabilização e efetividade

Mais uma vez, um clube foi punido por arremesso de objetos em campo durante uma partida, cometido por torcedor.

Lastimavelmente, esse tipo de infração não é singular no cotidiano do futebol, e por isso, desde 1981, o Código Brasileiro Disciplinar de Futebol (CBDF) em seu art. 300, já imputava como infração, a ausência de medidas suficientemente capazes de “prevenir ou reprimir o lançamento de objetos no campo”, prevendo sanção de multa à perda de mando de campo.

Referida previsão legal perdurou até 2003, quando passou a vigorar o art. 213 do Código Brasileiro de Justiça Desportivo, por meio do qual, além de manter como infração disciplinar no modo omissivo, incluiu uma possibilidade de excludente de responsabilidade.

Em uma abordagem correlata, este espaço do Lei em Campo já se ocupou sobre a responsabilidade pelo espetáculo esportivo. Iterando alguns pontos trazidos na ocasião, a responsabilidade pela segurança dos eventos esportivos incumbe as federações, confederações, as agremiações desportivas e ao poder público.

Atribui-se as entidades de prática desportiva o dever de comunicar à órgãos públicos com competência atinente à preservação e anteparo dos espetáculos esportivos, seriam esses a Polícia Militar, Corpo de Bombeiros, Vigilância Sanitária, Departamento de Trânsito, entre outros agentes estatais incumbidos de assegurar a ordem e segurança pública. A esse respeito, vale mencionar o art. 144 da Constituição Federal, inserido no Capítulo “Da Segurança Pública”, o qual preconiza que:

“Art. 144 – A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos:

I – polícia federal;

II – polícia rodoviária federal;

III – polícia ferroviária federal;

IV – policias civis;

V – polícias militares e corpo de bombeiro militares;

VI – polícias penais federal, estadual e distrital.”

Citada providência consiste em medidas preventivas, podendo ser ampliadas para além do papel institucional do Estado, contando com estratégias táticas privadas, como segurança própria do clube, informativos educacionais distribuídos aos seus torcedores, e até instalação de monitoramento eletrônico.

Importante que haja meios para prevenir, ou pelo menos repreender imediatamente quaisquer condutas que possam incorrer no tipo infracional desportivo descrito no art. 213 do CBJD. Isso porque trata-se de conduta omissiva própria ao tipificar que “Deixar de tomar providências capazes de prevenir e reprimir” desordens, invasão do campo ou lançamentos de objetos no local da disputa do evento desportivo.

Ou seja, a mera inobservância ou insuficiência ao comando de agir, já caracteriza a tipificação do art. 213 do CBJD, independentemente do resultado, por ser tipo infracional omissivo. Nesse sentido, nos termos do art. 156 do CBJD, “infração disciplinar é toda ação ou omissão antidesportiva, típica e culpável”.

Portanto, não basta o clube mandante eliminar qualquer situação que possa acarretar desordem, é necessário também que a agremiação desportiva incorpore medidas repressivas, capaz de identificar o quanto antes o indivíduo infrator.

Embora o CBJD, diferente da previsão anteriormente citada no início desse texto, no CBDF, preveja uma excludente de responsabilidade, caso haja o torcedor infrator que causou a desordem, invasão ou lançamento de objetos, venha a ser comprovadamente identificado perante a autoridade policial competente, o preceito do “caput” do art. 213 do CBJD compreende a responsabilidade objetiva à entidade de prática desportiva, com base na Teoria do Risco, por força do que dispõe o art. 3º do Estatuto de Defesa do Torcedor (Lei nº 10.671/2003), que equipara, para todos os efeitos legais, a entidade responsável pela organização da competição e a entidade de prática desportiva mandante como fornecedora, à luz do que estabelece o Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078/90).

A esse respeito, cabe incluir a disposição do parágrafo único do art. 2º da Lei Pelé, que constitui o exercício de atividade econômica a exploração e a gestão do desporto profissional, a qual deve ser respaldada pelos princípios citados na lei.

Por fim, destaca-se o direito a segurança nos eventos esportivos, antes durante e após o seu término, estabelecido no art. 13 do Estatuto de Defesa do Consumido, fixando medidas como as previsões dos arts. 39-A e 39-B, do referido diploma legal, que restringe o acesso à eventos esportivos aos infratores que deram ensejo ao tumulto, ou se envolveram em outras infrações disciplinares desportivas.

Ademais, a responsabilização não se limita à esfera disciplinar desportiva, podendo também incidir responsabilização civil e criminal da agremiação desportiva.

Para que a organização do espetáculo desportivo esteja de acordo com as regras, e suficientemente estruturado para garantir a qualidade, equilíbrio e disciplina para um espetáculo impassível, torna-se, então, imperiosa a identificação dos fatores que geram determinadas circunstâncias.

Não basta analisar indicadores da UEFA, ou outras referências das demais competições exitosas, sendo indispensável que o modelo jurídico desportivo brasileiro examine e se adeque às suas especificidades, para que não haja somente responsabilização dos clubes, mas uma estrutura capaz de corrigir os fatores que geram essa desordem.

Imposições legais de responsabilização certamente são indispensáveis. Contudo, para garantir efetividade no combate aos tumultos, desordens e violência no esporte, as organizações devem ponderar meios satisfatórios que assegurem que a responsabilidade recaia sobre quem de fato as cometeu.

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