Na última quinta-feira, dia 14.01.2020, o Pleno do STJD manteve a absolvição do técnico do Atlético Mineiro, Jorge Sampaoli (á época dos fatos suspenso) e do auxiliar Diogo Alves. A acusação, em resumo, era sobre dois fatos: a presença do treinador no estádio e a suposta comunicação com o banco de reservas. Em relação ao primeiro fato, a defesa do clube comprovou que o técnico tinha a autorização da CBF para estar no Mineirão – a questão foi, portanto, superada. Com relação ao segundo fato, contudo, a absolvição do técnico e do auxiliar deu-se por falta provas que fossem capazes de demonstrar que, de fato, houve comunicação com o banco de reservas.
Assim se manifestou a Procuradoria durante a sessão de julgamento[1]:
Em que pese ter uma atuação com evidencias jornalísticas, a fundamentação primordial da Comissão de origem foi se basear no artigo 58-A do CBJD que diz que o ônus incumbe à Procuradoria. A Procuradoria comprovou com material e ficou demonstrada a questão do contato no celular no mesmo tempo…Entende a Procuradoria que é vedado o comparecimento dele e a permanência seria burlar as regras da competição e ainda assim estar presente em um outro setor do estádio fornecendo orientações técnicas que não deveriam fornecer.
De fato, o Código Brasileiro de Justiça Desportiva – CBJD, em seu artigo 58-A determina que o ônus da prova da infração é da Procuradoria, ou seja, é ela quem deve fornecer todos os meios de prova dos fatos que alegou terem ocorrido na denúncia. Faz sentido que assim seja já que, como esta coluna já abordou, cabe à Procuradoria a função de defender a ordem jurídica e a disciplina desportiva.
O CBJD, determina que todos os meios legais são hábeis para provar a verdade dos fatos alegados no processo desportivo. Percebe-se que, na justiça desportiva, o direito à defesa é bastante amplo. Nem poderia ser diferente, já que a justiça desportiva tem como um dos princípios – elencados no Artigo 2º do CBJD, justamente o da ampla defesa. Tal princípio é constitucional, previsto no artigo 5º, LV da Constituição Federal, e assegura que as partes possam apresentar suas alegações e produzirem as provas que entendem ser pertinentes.
Sobre as provas na Justiça Desportiva, nos ensina Fernando Tasso[2] sobre a busca da verdade real:
A busca do processo disciplinar desportivo, mais uma vez traçando um paralelo com o processo penal, é a verdade real. Os auditores precisam descobrir a verdade dos fatos para que seja possível a aplicação de uma sanção disciplinar. Não há, como no direito civil, os efeitos da revelia, onde se consideram verdadeiros os fatos não contestados. O que importa no processo desportivo é a verdade real e não a verdade formal. (grifo nosso)
A determinação do CBJD sobre a produção de provas é clara: são admitidos os meios legais. A restrição do código é a mesma da Constituição: são inadmissíveis as provas obtidas por meios ilícitos, como gravações telefônicas clandestinas.
No caso do técnico do Atlético Mineiro, a prova que convenceria o tribunal acerca da veracidade dos fatos narrados na denúncia sobre a comunicação com o banco de reservas seria justamente a quebra do sigilo telefônico.
Ocorre que esta medida está além do alcance da justiça desportiva. O sigilo telefônico é o direito que o indivíduo tem ao segredo das ligações feitas e recebidas por seu aparelho telefônico. A Constituição Federal é clara neste sentido, prevendo, no Artigo 5º, XII, que “é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal.”
Apenas um juiz pode autorizar uma interceptação telefônica como meio de prova. A ausência de autorização judicial para a captação de conversas faz com que a prova seja obtida de forma ilegal, portanto nula.
A absolvição do técnico Jorge Sampaoli, portanto, deu-se justamente por falta de provas. A Procuradoria não foi capaz de, sem a interceptação telefônica, demonstrar aos Auditores do Tribunal Pleno, sem sombra de dúvidas, que o técnico manteve comunicação com o banco de reservas durante a partida.
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[1] Disponível em https://www.stjd.org.br/noticias/pleno-mantem-absolvicao-de-sampaoli-e-auxiliar
[2] TASSO, Fernando em Código Brasileiro de Justiça Desportiva CBJD: Comentários à Resolução CNE 29, de 10.12.2009, organizado por GRADELA, Paulo Cesar. BRACKS, Paulo. JORDÃO, Milton. Ed. Juruá. São Paulo, 2009.