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Respira e reage

No início de 2018, LeBron James respondeu de forma contundente à infame frase “Shut up and dribble”, que podemos traduzir como um “Cale a boca e jogue bola”, dita pela jornalista Laura Ingraham ao comentar uma entrevista na qual o maior pontuador da história da NBA, dentre outros assuntos, abordara os desafios que uma figura pública negra tinha de enfrentar nos Estados Unidos.

Pouco tempo antes, em maio de 2017, uma injúria racial fora pichada na porta da residência de LeBron em Los Angeles.

Não à toa, ele foi um dos jogadores mais vocais nas manifestações em apoio ao movimento Black Lives Matter que ocorreram na “bolha” organizada pela NBA nas instalações do Walt Disney World, em Orlando, no período mais agudo e de maiores incertezas da pandemia de Covid-19.

Nesta semana, lembrei-me da postura (re)ativa de LeBron e de outros atletas ao acompanhar a repercussão da luta de Vinícius Júnior contra os reiterados episódios de racismo sofridos em partidas do campeonato espanhol.

Na foto que ilustra este texto, Vinícius Júnior está vestindo a camiseta de LeBron James. E, assim como LeBron, o jogador brasileiro teve a coragem de não se calar e simplesmente jogar bola.

Ao fazê-lo, Vinícius trouxe legitimidade e relevância para uma causa que é justa e que não pode ser menosprezada ou esvaziada como simples “lacração” ou como pauta vazia de uma agenda “politicamente correta”.

Racismo, em qualquer de suas manifestações, é crime. Se o esporte tem o poder de mobilizar as pessoas no combate a essa “mazela”, que assim seja.

As ligas esportivas norte-americanas, principal objeto de estudo desta coluna, contam histórias importantes no que se refere ao poder de transformação do esporte relativamente às questões raciais.

No dia 15/04/1947, “Jackie” Robinson rompeu a “linha de cor” no beisebol, como retrata o filme 42 – A História de uma Lenda. Desde 2004, a MLB passou a adotar, no mesmo 15/04, o Jackie Robinson Day, data em que todos os jogadores de todas as equipes usam às costas o número 42 que o atleta vestia em sua camisa.

A ideia foi inspirada naquilo que um dos companheiros de equipe de “Jackie” Robinson teria dito: “Quem sabe se amanhã todos usarmos o 42 ninguém mais consiga nos diferenciar”.

Em 2003, a NFL aprovou a chamada Rooney Rule, que obriga as franquias da liga a entrevistarem candidatos de minorias étnicas para cargos de direção, o que passou a ser adotado também pela Federação Inglesa de Futebol a partir de 2018. A premissa é simples: esportes que têm tantos negros como protagonistas dentro dos campos e quadras não podem dar menos oportunidades a pessoas negras em outras posições.

Ainda na NFL, continuam a ser sentidos os efeitos do ato de Colin Kaepernick, que, em protesto diante da violência policial contra negros, passou a se ajoelhar durante a execução do hino nacional dos Estados Unidos antes do início das partidas.

No ano de 2014, manifestações racistas registradas em uma gravação de áudio feita pela ex-namorada de Donald Sterling, então proprietário do Los Angeles Clippers, resultou em investigação que culminou com o banimento perpétuo de Sterling da NBA, somado a uma multa de US$ 2,5 milhões e à obrigação de venda da franquia.

Ecos do caso Donald Sterling foram ouvidos em 2022, quando das punições impostas pela NBA a Robert Sarver, então proprietário do Phoenix Suns, do Phoenix Mercury (WNBA) e do clube de futebol espanhol Real Club Deportivo Mallorca. Suspenso por um ano e multado em US$ 10 milhões, Sarver não faz mais parte da principal liga de basquete do mundo.

É triste que ainda seja preciso “mexer no bolso” de pessoas e instituições poderosas, como La Liga no caso de Vinícius Júnior, para que condutas racistas sejam efetivamente coibidas e punidas. Só sairemos desse estágio, como humanidade, se mecanismos regulatórios específicos viabilizarem, além das repercussões econômicas, conscientização e transformação social.

Ainda assim, são os atletas que possuem as melhores ferramentas para dar impulso às mudanças.

A mensagem correta ressoa mundo afora a partir de gestos como os de Colin Kaepernick, Jesse Owens (nos Jogos Olímpicos de 1936), Tommie Smith e John Carlos (nos Jogos Olímpicos de 1968).

A mensagem correta ressoa mundo afora a partir de respostas como as de LeBron James ao “Shut up and dribble”.

A mensagem correta ressoa mundo afora a partir de atitudes como as de Yago Mateus, armador da seleção brasileira de basquete que sofreu ofensas racistas (também na Espanha) e que cobrou publicamente que as autoridades competentes tomassem providências. Como fez Vinícius Júnior.

O esporte, com e por Vinícius Júnior, respira e reage. Ao fazê-lo, quem respira e reage é a própria sociedade.

Crédito imagem: Alexandre Loureiro/NBA Brasil

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