Em alguns textos anteriores neste espaço, já nos referimos ao Código Desportivo do Automobilismo. É esse o documento que prevê, por exemplo, a possibilidade de que empresas promotoras organizem competições automobilísticas sob a chancela do sistema federativo, que estipula as regras sobre emissão de licenças a pilotos e equipes e que norteia as atividades dos comissários desportivos.
Trata-se, afinal, do principal instrumento normativo do automobilismo brasileiro. Editado pela Confederação Brasileira de Automobilismo (CBA), equipara-se a um vasto regulamento geral, cujos objetivos são bem resumidos em seus artigos 2.1, 2.3 e 3:
“2.1 – O objetivo deste Código com seus anexos é, regulamentar, incentivar e facilitar a prática do esporte automobilístico.”
“2.3 – O presente Código representa o conjunto de normas que regem o desporto automobilístico nacional e é de observância obrigatória em conjunto com o Código Desportivo Internacional da FIA.”
“Art. 3 – Toda federação filiada, denominada neste Código como FAU, ou liga vinculada à CBA, e toda associação desportiva filiada a uma dessas federações e/ou ligas, serão consideradas como conhecedoras deste Código, devendo respeitá-lo e fazer com que seja respeitado em sua íntegra.”
Portanto, toda e qualquer competição, evento ou prova de automobilismo no Brasil inserida na estrutura federativa que tem a CBA como entidade nacional de administração de desporto deve observar os preceitos mínimos estabelecidos neste Código. Significa dizer que os regulamentos específicos das competições devem tê-lo como norte, não sendo permitido a priori o estabelecimento de normas contrárias ao disposto nesse documento.
Diante de tamanha relevância, convém destacar algumas das principais inovações da versão 2021 do Código em comparação ao que dispunha em 2020.
O artigo 65 dispõe que a atribuição de pontos em campeonatos, torneios, copas e troféus deve se dar conforme o regulamento específico da categoria correspondente; o artigo 66, por sua vez, também delega aos regulamentos específicos a possibilidade de instituir o sistema de descarte. Em outras palavras, o Código permite que cada competição determine como será atribuída pontuação a pilotos e/ou equipes, bem como tenha liberdade de implementar, ou não, o descarte – e isso já era previsto no ano passado.
A mudança para 2021 é que o Código passa a conter importante limitação quanto à alteração dessas matérias nos regulamentos específicos das competições: ficam vedados adendos aos regulamentos de uma competição que tenham a finalidade de alterar o critério de pontuação ou de alterar o esquema de descarte. Em resumo, impede-se a mudança das regras do jogo durante a competição – o que a princípio é muito bem vindo.
Utilizamos a expressão “a princípio” como uma ressalva específica do contexto que atualmente vivemos. Em 2021, infelizmente, segue sendo necessária máxima atenção com relação à pandemia de Covid-19 – o que eventualmente poderia demandar alterações imprevistas no calendário, ou mesmo o adiamento do início de competições. Assim, em caso de necessidade de se realizar uma competição com menos provas do que originalmente previsto, o organizador/promotor da mesma teria menos liberdade em, por exemplo, passar a prever menos descartes na mesma proporção.
Na seção que trata do safety car, o Código apresenta duas mudanças. Em termos de sinalização, o acionamento do carro de segurança passa a demandar que, além da bandeira amarela imóvel, todos os postos de sinalização exibam uma placa com as letras “SC”. Além disso, passa-se a permitir expressamente que, após a retirada do safety car da pista e exibição da bandeira verde, ultrapassagens sejam realizadas “mesmo antes do cruzamento da linha de largada/chegada”. Ambas as alterações encontram-se no artigo 98 do Código, e refletem a permanente evolução dos procedimentos de safety car – importante mecanismo no resguardo da segurança, como já vimos anteriormente.
Ainda no que tange à sinalização, nota-se uma flexibilização dos procedimentos em caso de bandeira vermelha. Em 2020, o Código era taxativo ao determinar que os pilotos deveriam “parar de competir, diminuir a velocidade e se dirigir ao pit lane” quando acionada a bandeira vermelha. Embora essa continue sendo a regra geral, em 2021 o Código passa a permitir, em seus artigos 107, 108 e 124.1, que os regulamentos específicos de cada campeonato possam estabelecer procedimento diverso. Da mesma forma, o artigo 125.1 também confere maior liberdade aos regulamentos específicos para dispor sobre o alinhamento dos veículos na relargada após a interrupção da prova.
O Código também contempla ajustes em sua redação no capítulo dedicado à Justiça Desportiva, melhor adequando sua terminologia àquela prevista no Código Brasileiro de Justiça Desportiva (CBJD). É o caso, por exemplo, do art. 165, em que se substitui “apelação” por “recurso voluntário”. Sob o aspecto material, contudo, mais relevante é a mudança no artigo 161.2, que passa a prever que as comissões disciplinares serão compostas por um mínimo de 5 (cinco) membros – em conformidade com o estabelecido nos art. 4º-A e 5º-A do CBJD.
Enfim, por mais sutis que possam ser as mudanças no Código, fato é que elas podem impactar todas as competições do automobilismo nacional. Por isso, é fundamental que todos os stakeholders estejam atentos às novas disposições: pilotos e equipes porque necessitam conhecer as regras da disputa; e federações e promotoras porque, a partir das novas normas em vigor, têm ciência dos limites (ou novas liberalidades) a serem observados nos regulamentos específicos das competições de sua competência.